PEDRO SATURNINO VIEIRA DE MAGALHÃES

O cantor das aves daquelas matas: Pedro Saturnino Vieira de Magalhães


O poeta Pedro Saturnino (CARVALHO, 1998)



Garimpando, tronco acima, altíssimo madeiro,
a árvore toda sonda, escruta, esgaravata.
Bate o bico no pau, que treme todo inteiro,
como passaro algum possa existir que bata.

A casca resistente, a fibra mais compata
de “Cabiúna” ou “Marfim” cede ao golpe certeiro:
dir-se-ia algum perito e velho machadeiro
em pleno coração da retumbante mata!

Essa mesma cautela... esse mesmo cuidado...
A pancada precisa... A madeira revessa...
A figura encardida... o topete encarnado...

É ver o lenhador dentro da mata espessa,
manejando como um relâmpago o machado,
em mangas de camiseta o lenço na cabeça![1]

            O ilustre poeta mineiro Pedro Saturnino Viera de Magalhães nasceu na fazenda Bom Jesus[2], no município de Cabo Verde, em 1883. Filho dos fazendeiros Saturnino Vieira e Silva e Dona Carolina de Magalhães Vieira. Carolina de Magalhães Vieira era filha do Major Joaquim Leonel Pereira de Magalhães e neta do Barão de Cabo Verde.
            Foi poeta, jornalista, professor e farmacêutico. Pedro Saturnino iniciou sua escolar estudando em Caldas e Poços de Caldas, e logo transferiu-se para São Paulo, onde cursou a Escol Americana, diplomando-se em letras. Estudou engenharia civil no Mackenzie em São Paulo até o começo do 4º ano, onde se bacharelou em letras ao 20 anos. Em 1906 formou-se em ciências naturais e farmacêuticas da Escola de Farmácia, Odontologia e Obstetrícia de São Paulo.
            Foi farmacêutico em Muzambinho em 1907, em Cabo Verde, em 1916, e também foi farmacêutico em Botelhos, São Sebastião da Grama, Tapiratiba e São Paulo.
            Casou-se em Muzambinho com sua prima Dona Judite Navarro, filha do Cel. Navarro, em 30 de maio de 1907. Neste ano começou a lecionar, desde o início do ano Física, Química e História Natural no Lyceu de Muzambinho. “Depois... foi pelo mundo em fora, até que para lá tornou em 1930, como professor de inglês do Ginásio Mineiro de Muzambinho.” (SOARES, 1940). Em 1935, pediu ao governo de Minas sua renúncia à cadeira que ocupava e aceitou a cadeira de português do Ginásio “Euclides da Cunha” em São José do Rio Pardo, onde lecionou em 1936 e 1937, com professor interino, e, em 28 de dezembro de 1938, por questões políticas foi dispensado, e radicou-se em Tapiratiba. Também foi professor em Cajurú, no estado de São Paulo.
            Em Muzambinho viveu de 1907 a 1916 e de 1930 a 1935, quando foi professor do Lyceu. Chegou a ser vice-diretor do Lyceu.
            Soares em seu livro (1940) conta que o conheceu o poeta em 1935 em um comício em Casa Branca. Soares (1940) diz que seu livro “Boitatás” (1926) recebeu menção honrosa da Academia Mineira de Letras. Outro livro seu foi “Grupiaras” (1922 segundo a UFSC, e segundo Soares 1930) é o mais célebre.  
Soares fala de seus livros inéditos: “Sambaquis”, “De galope”, “Bagas de sangue”, “Plumas”, “Timbiras” e “Guaianazes” (poemas épico-simbólico), “Tersos de rimas”, “Avoz do sangue”, “Salamandras”, “Rubis de sangue”, “Nódoa” e “Ramo seco”. Os livros “Mãe de Ouro” (1951) e “Nódoas” (1947), livros de Poesia, como Grupiaras, são citados no catálogo de obras brasileiras da Universidade Federal de Santa Catarina.
A genealogia de Pedro Saturnino (com seus parentescos com o ator global Tarcísio Meira[3], bisneto do Major Leonel; e com o cientista Vital Brasil, seu primo) está presente no célebre texto de Lael Vital Brasil (BRASIL, 1996)[4] sobre a genealogia do seu pai, o célebre cientista, incluindo relações de parentesco com Tiradentes e Wenceslau Brás. A família de Vital Brasil está ligada fundamentalmente a Cabo Verde, sendo que o pai do cientista, um dos maiores do país, é nascido no município.
            Pedro Saturnino discursou em nome da Escola Normal de Muzambinho no enterro do dr. Lycurgo Leite, deputado federal constituinte de Muzambinho em 1933 e um dos maiores políticos do Sul de Minas, nos anos 30.
            O Muzambinho de 02/02/1947 nos mostra que Pedro Saturnino também tentou se enveredar pela política, não sendo bem sucedido: ele se candidatou a deputado federal obtendo apenas 9 votos em Muzambinho e 6 em Monte Belo.
            O “Correio de Muzambinho” de 18/06/1916 anuncia sua mudança para Cabo Verde. Capri (1917) refere-se ao poeta como “autor das “Grupiaras””. Pereira Filho (1991) o chama de “o bardo”, Soares (1940) o considera “consagrado poeta mineiro” e Bueno (1923) chama de “o cantor das aves daquelas matas”.
            No site http://www.secrel.com.br/jpoesia/psaturnino.html#biografia encontramos poemas de Pedro Saturnino, enviados por Renato Navarro Magalhães (seu filho ou neto?): “Nívea”, “O Pé de Açucenas”, “O Marreco”, “Flor Serrana” e “Esperança”.
            A biografia do poeta é contada no site com algumas diferenças da versão de Soares (1940):
Filho de Saturnino Vieira e Silva e Cândida Carolina de Magalhães Vieira, PEDRO  SATURNINO  VIEIRA MAGALHÃES nasceu a 29.06.1883 na fazenda da Assunção, município de Cabo Verde, Estado de Minas Gerais. 
TRAÇOS BIOGRÁFICOS  (Transcrição da obra  “Pedro Saturnino – O Poeta e a Obra”, de Itabajara Catta Preta  -  Cadernos Literários (nº 50) - Edições Caravela, do Instituto Cultural Português de Porto Alegre - RS, 1986) Os intelectuais de Minas, S. Paulo e Paraná estão convocados para levantar merecido preito de homenagem à memória do ria Poeta PEDRO SATURNINO VIEIRA MAGALHÃES, cujo centenário será comemorado em  Cabo Verde (MG), sua terra natal, no próximo dia 29 de junho do corrente ano. Embora –  por  causa exclusiva da  grande modéstia de sua vida – careça  o nome de PEDRO SATURNINO da  fama e glória a que faz  jus, não podem  aqueles que  conhecem sua  obra  poética –“Grupiaras” ”Boitatás”, “Nódoas” e “Mãe de Ouro” – deixar transcorrer sem registro a efeméride  gloriosa para todas as localidades em  que ele viveu e que engrandeceu com os tesouros de sua alma cintilante e os frutos da poética sumarosa e vivificante.
 Nascido em fazenda do interior mineiro e radicado em S. Paulo, formou-se em Letras e em Ciências Farmacêuticas, abraçando a carreira de Professor, que exerceu em várias cidades de Minas Gerais e de São Paulo.
 A insuficiência da remuneração percebida – mesmo multiplicada pelas cadeiras de Física, Química, História  Natural, Português e Inglês e acrescentada pelo acolhimento de alunos particulares – procurava compensar no exercício do  comércio farmacêutico (que exercia como um sacerdócio), na “Pharmacia Magalhães”, de cujo funcionamento em  São Sebastião do Grama –SP, subsiste valioso documento em carta manuscrita, do Poeta a sua sobrinha  D. Saturnina Reis Martins,  datada de 24.03.1923, cujo papel apresenta o timbre do estabelecimento.
 Orador eloqüente e de palavra fluente e iluminada, foi, contudo, na poesia que realizou seu grande destino de artista, filósofo, mestre, crente e chefe-de-família fiel,dedicado e amoroso – sempre um bom e um justo.
 Sua poesia que exalta – em “Grupiaras” e  “Boitatás” – principalmente e a natureza –  que seus versos decantam culminando em poemas cíclicos “A Árvore” e “O Boi” – atinge os  mais altos  níveis introspectivos  e líricos em “Nódoas”, no s sonetos “O Pé de Açucenas”  e nos dedicados a cada um dos dez  filhos, alcançando haustos de sublimidade e arroubo no poema “Na Estrada de Santiago”, consagrado à filha morta, Nívea.
 “Mãe de Ouro”, seu último livro publicado – prêmio de 1949 em concurso do Centro de Letras do Paraná -  veio a lume em 1951, época em que o Poeta já sofria do doloroso mal que o viria  abater, entre  intensos sofrimentos, atingido  física e espiritualmente, levando-o afinal dentre os vivos, a 18 de março de 1953, antes de completar 70 anos de idade.
 Faleceu Pedro Saturnino na cidade de Curitiba-PR, tendo pertencido ao Centro de Letras do Paraná e à Academia de Letras José de Alencar.
            Itabajara Catta Preta escreveu “Pedro Saturnino – O Poeta e a Obra”, em 1988, conforme informação do site: http://www.vaniadiniz.pro.br/it_serenata.htm. Poema de Pedro Saturnino sobre o papel das aves na viagem da família de Jesus Cristo pelo Egito está disponível em: http://jangadabrasil.com.br/janeiro41/im41020a.htm.
            É o patrono da Escola Estadual de Cabo Verde. A outra escola estadual da escola EE Major Leonel, homenageia seu avô.
            O poeta faleceu em 1953 em Curitiba – PR (COUTINHO, 2001), onde há uma rua que homenageia o cabo-verdense.
            Muitos pensam que ele foi professor da EE Prof. Pedro Saturnino de Magalhães, mas ele faleceu antes da fundação da escola, fundada em 1959. Em 1983 foi comemorado o seu centenário.

            O importante poeta brasileiro, Cassiano Ricardo, que foi professor da faculdade de Guaxupé[5], se refere a Pedro Saturnino: “Ninguém, na literatura brasileira, escreveu coisas mais belas respeito aos cantores alados que povoam as nossas matas”.
            A biografia do Poeta é descrita com detalhes no livro de Carvalho (1998), inclusive com depoimentos de seu filho Almo Saturnino sobre a vida do pai: “Conhecia ele os pássaros de todas as cores, as aves canoras, o sabor de todo os frutos, o cantar dos córregos tranqüilos, o perfume do mato e do mel, das relvas picantes e das flores silvestres. Sua poesia é, antes de tudo, panteísta. Ele transpõe para o mundo pás palavras, em versos suavíssimos, toda a luxuriante beleza de sua terra natal e das regiões vizinhas: Botelhos, Caldas, Poços de Caldas e Muzambinho.”
           
            Adilson de Carvalho faz uma interessante discussão sobre o nascimento de Pedro Saturnino: alega que os biógrafos do poeta dizem que seu nascimento é o dia de São Pedro 29 de junho, mas, que consultou os arquivos paroquiais de Cabo Verde e encontra a data de nascimento do poeta como 24 de junho.

            Adilson de Carvalho, também apresenta elogios e comentários às suas obras Grupiaras, Boitatás, Nódoas e Mãe de Ouro e sobre o seu “maior poema”, Pedra Lisa, em homenagem à uma cachoeira nos arredores de Cabo Verde, com o nome Pedra Lisa.
            O autor mostra que Pedro Saturnino teve uma editora, chamada Editora Hélios, pertencente a Pedro Saturnino, Cassiano Ricardo e José Del Píchia, irmão de Menotti Del Pichia (este último, como Cassiano Ricardo, também professor da faculdade de Guaxupé). Por essa editora publicou Boitatás.
            O livro Mãe de Ouro foi premiada no concurso de livros de 1949 no Paraná com o gênero poesia, o chamado “Prêmio Ricardo Lemes”, de Curitiba, sendo a obra dedicada a Muzambinho, Cabo Verde e Botelhos, “tripartido coração”.
            São três páginas do livro dedicadas à obra poética do caboverdense.

            Na biografia extensa que Adilson de Carvalho faz do poeta de sua cidade, ainda fala de Pedro Saturnino como orador, jornalista e cantor. E também como homem bom (diz que o poeta morreu pobre e era bom e caridoso, acolhendo pobres em sua casa).
            Apresenta ainda um texto com o título “As cartas de Pedro Saturnino revelam seu sofrimento” e “críticas ao poeta” (críticas literárias, todas positivas). Sampaio Freire, no jornal “O Estado de S. Paulo” em julho de 1926 diz: “bastavam dois poemas para que o público o consagrasse, mas ele quis nos premiar com muitos”, e faz uma série rasgada de elogios. Almeida Magalhães nos diz sobre o poeta: “um dos poetas mais brasileiros do Brasil, e seu nacionalismo é espontâneo, natural como a sua poesia”.
            Pedro Saturnino foi elogiado nos jornais “A Folha da Manhã”, “O Estado de S. Paulo”, “A Gazeta”, “O Diário da Noite”, “O Jornal do Comércio”, “O Correio Popular”, “A Resenha”, entre outros, e foi citado elogiosamente pelos escritores Sampaio Freire, Sud Mennucci, Martin Damy, Aureliano Leite (da Academia Paulista de Letras, irmão do dr. Lycurgo Leite), Silveira Bueno, Cassiano Ricardo, Almeida Magalhães, Amadeu Amaral entre outros.
            Pedro Saturnino é patrono de cadeiras do Centro de Letras do Paraná, da Academia de Letras “José de Alencar” de Curitiba, da Academia de Letras das cidades de Poços de Caldas, Campanha, Brasília, Jundiaí. É nome de uma rua de Curitiba, da biblioteca municipal de São João da Boa Vista e da escola de ensino médio de Cabo Verde. Seu livro Boitatás recebeu menção honrosa da Academia Brasileira de Letras.
           
            Pedro Saturnino teve 10 filhos: Nívea, Alcy, Meiga, Almo, Belkiss, Jade, Glauco, Maiby, Saturnino e Loio Pérsio. Almo Saturnino, nascido em Muzambinho, seguiu a carreira do pai, se tornou poeta e professor de ensino médio e superior, pós graduado na UFRJ, tendo sido professor do Colégio Pedro II do Rio de Janeiro, aprovado por concurso.

            As obras do poeta são altamente estudadas pelo Museu da cidade de Cabo Verde, sob coordenação das profas. Ironi Viana e Vanda Palma. Lá, encontramos indícios de que o poeta foi amigo de Monteiro Lobato e textos com dedicatórias inclusive à Malba Tahan.


Todo material e imagens acima, nessa página são livres e podem ser utilizados de acordo com a licença:

citando como autor Otávio Luciano Camargo Sales de Magalhães
(não se aplica para o publicado daqui para baixo)



[1] “O pica pau”, do seu livro “Pluma”: “um soneto alexandrino magistral na sua musicalidade e expressivo e preciso no seu conteúdo. Compará-lo a um diamante carinhosamente lapidado não é ainda atribuir-lhe todo o seu valor.”, diz Soares (1940)
[2] Soares (1940) e Carvalho afirmam(1998) isso, mas netos do poeta afirmam ele ter nascido na Fazenda Assunção. Soares diz que Pedro Saturnino nasceu na fazenda de seu avô, Major Leonel.
[3] Só para deixar mais clara as afirmações. Pedro Saturnino é primo em segundo grau do ator global Tarcísio Meira. Pedro Saturnino é o segundo filho de Cândida Carolina de Magalhães, oitava filha do Major Joaquim Leonel Pereira de Magalhães. O segundo filho do Major Leonel era José Jacinto Pereira de Magalhães, nascido em Cabo Verde. José Jacinto foi vereador da primeira Câmara Municipal de Muzambinho, quando morava em Guaxupé (que era distrito de Muzambinho): foi o primeiro patrão de Vital Brasil. José Jacinto era casado com sua prima em segundo grau Francisca Amélia Pereira da Cruz e pai de Maria da Conceição Filipina de Magalhães, primeira esposa de Vital Brasil e de Raul Pompéia de Magalhães, pai de Tarcísio Meira, sendo Maria da Conceição e Raul Pompéia naturais de Guaxupé. A segunda mulher de Vital Brasil também era sua prima. Vital Brasil é tio por afinidade e primo em quarto grau de Tarcísio Meira. Vital Brasil é primo em terceiro grau e primo afim em primeiro grau de Pedro Saturnino. Tarcísio Meira é primo em segundo grau de Pedro Saturnino. O Major Leonel é avô de Pedro Saturnino, bisavô de Tarcísio Meira e tio avô de Vital Brasil. Interessante observar que o avô de um ator conhecido em todo o país foi vereador em Muzambinho. Há uma genealogia na Internet: Major Leonel: http://www.geneall.net/P/per_page.php?id=596243; José Jacinto: http://www.geneall.net/P/per_page.php?id=596243; Raul Pompéia: http://www.geneall.net/P/per_page.php?id=595897; Tarcísio Meira http://www.geneall.net/P/per_page.php?id=595895, acessados em outubro de 2007.
[5] Lecionaram na Faculdade de Guaxupé, o prof. João Marques de Vasconcellos, o prof. Roberto Bianchi, a profa. Maria Antonieta Coimbra Campedelli, o prof. Cláudio Vilas Boas, o prof. Almiro Borelli, todos nomes envolvidos na política muzambinhense,  parte do primeiro corpo docente daquela escola. A Faculdade de Guaxupé teve professores os importantes literatos Menotti Del Picchia (que morou em Guaxupé, sendo que seu neto, Totonho, foi prefeito de Guaxupé), Cassimiro de Abreu e Guilherme de Almeida (que criou o brasão de Guaxupé, a partir de um concurso, com os dizeres “Ápice Apta Apis” – a abelha está prestes a atingir as alturas). Posteriormente teve como professor o escritor Elias José, falecido recentemente. No curso de pós-graduação ainda teve como professores José Geraldo Vieira e Lígia Fagundes Telles.