Bortolottis e Babbônis
Estevão “Tézo”
Bortolotti[1]
UM POUCO DA SAGA DESTES
IMIGRANTES ITALIANOS
Em
fins do século passado havia fome na península itálica. O problema das terras cansadas
por séculos e mais séculos de exploração agrícola sem interrupção era
seriamente agravado pela densidade demográfica. Sem solução para a crise,
autoridades do país incentivam e facilitam constantes emigrações para outros
países, destacando-se tratados e consequentes acolhida dos Estados Unidos da
América do Norte, Brasil e Argentina.
O
grosso dos imigrantes provinham de aldeias da zona rural, e foi assim que o
signore ESTEVAM BORTOLOTTI vinhateiro e oleira na aldeia de SÃO VITTO,
província de LUCCA, resolveu liquidar seus negócios e vir tentar a sorte no
Brasil.
Trouxe
consigo a esposa Luiza e os bambinos Josép, João, Maria e meu pai[2],
Luiz, mais tarde conhecido por todos pela alcunha de LUZ PADEIRO.
De
princípio residiram em Piracicaba, mais tarde fixaram residência definitiva na
capital paulista. Ainda criança (12 anos) meu pai deixou o lar para trabalhar
em São José do Rio Pardo, depois Guaxupé e por fim MUZAMBINHO onde – sempre na
profissão de padeiro – tornou-se um adulto, casou-se com a minha saudosa mãe
PAULINA, labutou e criou numerosa família de onze filhos, falecendo aos 78 anos
de idade.
Trabalhou
como padeiro para a senhora CAMILA CARLLI e REOSTRATO CARLLI, vulgo VÉIO DA
CAMILA, mais tarde por conta própria no ramo de padaria e secos e molhados.
Era
alegre, popular e muito conhecido pelos seus “causos” e por ser muito forte e
exímio lutador de LUTA ROMANA, modalidade esta que deu origem à LUTA LIVRE.
Certa feita foi escolhido para enfrentar o desafio do famoso lutador alemão no
TEATRO CARLOS GOMES, hoje prédio sede da RÁDIO RURAL[3].
O alemão era um verdadeiro gigante, contava o já finado ALCEU dentista e foi
derrotado por meu pai, por nocaute, no quinto raude, não sem antes de ter
atirado “AQUELE CACAMANO DE FERRO” por três vezes fora do ringue, bem no meio
da plateia.
Entre
as histórias contadas pelo meu velho Luiz Padeiro lembro-me de uma que falava
de um casal de saltimbancos calabreses, que por aqui apareceram acompanhados de
enorme URSO PARDO que dançava e batia palmas, enquanto a mulher cantarolava e o
homem tocava sanfona. O homem colocava seu chapéu emborcado no chão, o povo
fazia círculo e atirava moedas dentro do mesmo. Acabaram ficando em Muzambinho,
tiveram filhos, mudaram de profissão, e, hoje, vários muzambinhenses
importantes trazem nas veias o sangue quente desses aventureiros de outrora.
Falava
das memoráveis festas de São Roque promovidas pela família CERÁVOLO, da
disposta de ROLAR O QUEIJO, evento que acontecia na Av. Américo Luz, com a
participação dos italianos mais atletas, e cujo campeão, por duas vezes, foi um
robusto jovem recém chegado da Itália, de nome ORÁCIO (Moura) BIANCHI.
Gostava
de recordar também das famosas reuniões noturnas nas dependências da padaria da
Dona CAMILA e seu REOSTRATO, com muito vinho tinto, queijo parmesão, cabrito
assado e o legendário TINTORETTO, (e não tintureiro como muitos dizem)
executando alegres tarantelas na sua sanfoninha, ou concertina, de doze baixos.
Reuniões respeitosas, de confraternização e troca de idéias e notícias dos
amados parentes que ficaram na longínqua pátria de origem, a bela e jamais
esquecida Itália.
Pelo
lado materno meus avós ADOLFHO BABBONI e LUZIA PEDRINI, naturais da região de
PIZZA e vindos para o Brasil nas mesmas difíceis circunstâncias da família
Bortolotti.
Durante
muitos anos Vó Luzia – que eu cheguei a conhecer quando pequeno - , ajudou meu
Avô a cria a família, vendendo doces no pátio do LICEU MUNICIPAL, hoje COLÉGIO
ESTADUAL. Usava uma mesinha com cavaletes, e, acreditem, vendia também FLORES!
Rosas, cravos e violetas que os então românticos rapazes costumavam enviar ou
simplesmente largar na carteira de determinadas moças... ou, num belo gesto de
carinho, gratidão e respeito, caprichosos buquês que alunos ou alunas
costumavam oferecer aos seus mestres. Fato interessante: Vó Luzia era
analfabeta, mas jamais esquecia o nome e a aparência dos fregueses a quem
vendia à crédito. Mas nunca era enganada. NÃO NAQUELES TEMPOS!
Vô
Adolfho possuía duas carroças e fazia o serviço de limpeza da cidade. Era o
lixeiro da Prefeitura. Morreu tragicamente quando um dos seus animais o atingiu
com um coice na cabeça. Aconteceu tristeza, amargura, mas não fome, privações,
não existia nenhuma garantia trabalhista, mas continuou existindo uma viúva
italiana, mulher de fibra, e nunca faltaram fregueses gulosos e românticos para
seus doces e flores. Enquanto vovó trabalhava no pátio do Liceu, minha mãe,
Maria Paulina, e irmãs, ainda pequenas, cuidavam do lar.
Muzambinho
do final do século dezenove e princípio do vinte foi uma cidade culta, folclórica,
romântica, MARAVILHOSA e para tanto muitos contribuíram a raça negra e não só
as famílias italianas como também a colônia sírio-libanesa, imigrantes que aqui
aportaram e tiveram influência decisiva no progresso da nossa amada cidade.
Luiz Bortolotti - Foto constante do artigo