#66 Muzambinho e... Carlos Drummond de Andrade
Otávio Luciano Camargo Sales de Magalhães
O mineiro Carlos Drummond de Andrade, em foto de domínio público.
Carlos Drummond de Andrade, o poeta, por três ocasiões apareceu na história de Muzambinho:
· No poema célebre “Aula de Português”, cita Carlos Góes, que foi promotor público em Muzambinho, e também professor do Lyceu do prof. Salathiel de Almeida.
· Ele produz um texto em homenagem para Jackson de Figueiredo, examinador do Lyceu, que cognominou Muzambinho como a “Athenas do Sul de Minas”.
· Em um telegrama que enviou ao Dr. Lycurgo Leite, por ocasião de seu falecimento, indicando que havia uma relação de proximidade ou conhecimento entre ambos. Ele assina o telegrama como Dr. Carlos Drummond de Andrade, sendo o “Dr.” Pelo fato de sua formação de farmacêutico.
Carlos Drummond de Andrade
Foto de Domínio Público
Famosa foto de Carlos Drumond de Andrade na orla marítima em famosa estátua (onde é comum as pessoas tirarem fotos com o poeta em bronze).
CARLOS GÓES
Veja o poema que cita Carlos Góes, de autoria de Carlos Drummond de Andrade:
Aula de Português
A linguagem
na ponta da língua,
tão fácil de falar
e de entender.
na ponta da língua,
tão fácil de falar
e de entender.
A linguagem
na superfície estrelada de letras,
sabe lá o que ela quer dizer?
na superfície estrelada de letras,
sabe lá o que ela quer dizer?
Professor Carlos Góis, ele é quem sabe,
e vai desmatando
o amazonas de minha ignorância.
Figuras de gramática, esquipáticas,
atropelam-me, aturdem-me, seqüestram-me.
e vai desmatando
o amazonas de minha ignorância.
Figuras de gramática, esquipáticas,
atropelam-me, aturdem-me, seqüestram-me.
Já esqueci a língua em que comia,
em que pedia para ir lá fora,
em que levava e dava pontapé,
a língua, breve língua entrecortada
do namoro com a prima.
em que pedia para ir lá fora,
em que levava e dava pontapé,
a língua, breve língua entrecortada
do namoro com a prima.
O português são dois; o outro, mistério.
Carlos Góes era filólogo e autor de gramáticas da Língua Portuguesa, que ensinava as regras de escrita, inclusive de estilística. Alguns livros podem ter sido gerados em Muzambinho.
Abrahão Costa de Freitas, professor do curso e colégio Rumo de São Paulo e também do curso Gpi, escreveu o texto “Gramática e Literatura: diálogos intertextuais”, disponível em http://alb.com.br/arquivo-morto/edicoes_anteriores/anais16/sem11pdf/sm11ss07_04.pdf, onde ele analisa o texto:
Os segredos que o professor Carlos Góis traz consigo constituem um sistema de comunicação secreto cuja sobrevivência depende da ocultação de seus verdadeiros significados: a gramática convertida em estenografia**: Figuras de gramática, esquipáticas, atropelam-me, aturdem-me, seqüestram-me. As “Figuras de gramática esquipáticas”, cuja excentricidade atropela, aturde e seqüestra, recobrem a linguagem de uma casca porosa sob a qual se ocultam extravagâncias cuja perpetuação é um desserviço à comunicação. “O amazonas da ignorância” de cada um de nós nada mais é do que o reflexo da intransigência daqueles que desconsideram as relações contextuais e espaço-temporais de qualquer enunciação. Os significados morais, estéticos, científicos e mágicos dos quais resultam os processos de enunciação são desprezados em nome de uma normatização inócua, que considera a gramática como um fim em si e não como um meio. Cria-se, assim, uma concepção de sintaxe e língua, que passando ao largo da “questão de uso” de Veríssimo (1985, p. 14), perpetuam “miudezas normativas” de insuportável “purismo rançoso”. São atitudes que em nada contribuem para a eficiência comunicativa e que produzem no falante a sensação de que o estudo da língua é “uma grande chateação”
JACKSON DE FIGUEIREDO
O filósofo católico, fundador do Centro Dom Vital e responsável pela conversão ao cristianismo de diversas personalidades, entre elas, Alceu Amoros Lima, recebeu uma homenagem publicada na revista “A Ordem”, volume LVI, n. 5, 1956. A revista “A Ordem”, do próprio Centro Dom Vital,
Ode a Jackson de Figueiredo
Ode a Jackson de Figueiredo
Carlos Drummond de Andrade*
Belo Horizonte, 1929
Jackson
nem amigo nem inimigo,
nem mesmo (o que seria cômodo) espectador displicente na sua poltrona
espiando teus gestos, tuas palavras e obras,
mas distante, extraordinariamente distante daquilo que foi a tua vida,
mais distante ainda dos mundos que explorastes, viajante inquieto, sem tempo para esgotá-los, e só te conhecendo bem depois que abriste os braços para morrer,
aqui estou, testemunha depondo.
Jackson,
os que te conheceram e te amaram
os que te conheceram e não te amaram
os que não tiveram tempo de te amar,
os que não cruzaram no teu destino, os que ignoram o teu nome, os que jamais saberão que exististes, estão todos um pouco mais pobres do que eram antes.
Uns perderam o amigo.
Outros , o inimigo, o grande e belo inimigo que orgulha.
Outros nada perderam, e é tão triste, tão doloroso não perder nada.
Como estes, eu me sinto pobre da pobreza de não ter sido dos teus Jackson,
e eu sinto verdadeiramente por todos aqueles que jamais suspeitarão disso.
Voltou o tempo dos prodígios.
Ainda há pescas maravilhosas, eu sei.
E os peixes que arrebatastes a um mar mais crespo que o de Tiberíades
Estão cantando a glória do Senhor.
Milhares de escamas, milhares de dorsos, de luzes, de almas
elevam um cântico tão puro que a terra se mistura com o céu
e nem se percebe o pescador que as ondas arrebatam,
que as ondas arrebatam violentamente, para depois se apaziguar, enquanto o corpo mergulha e os peixes cantam a glória do Senhor.
Agora sentimos que estás mais perto de nós,
Que por obscuros caminhos nós chegamos mais a ti,
(pouco importam as ondas e esta camada de terra que nos separa de tuas espécies em decomposição).
Muitas coisas nos ensinou a tua morte, que a tua boca não soubera exprimir e a tua pesca mais opulenta, Jackson, foi a de ti mesmo pelo oceano pesca terrível e prodigiosa de amor e redenção.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Ode a Jackson de Figueiredo. A Ordem, Rio de Janeiro, v. 9, n.4, p. 150-151, dez. 1929.
Note que o poeta faz uma alusão à morte do cristão Jackson, num acidente durante uma pescaria.
LYCURGO LEITE
Em 1936, quando Lycurgo Leite faleceu, recebeu telegramas de todo o Brasil, inclusive de ministros, deputados, senadores e governadores. Na extensa lista de telegramas, encontramos o seguinte:
CURIOSIDADE ACHADA NA INTERNET
Quintais
Cláudia F Pacce
Coisa de lembrar.
O café mormaçando os óculos,
jaboticabeira pintada de fruta e pardal.
O pato da Índia, modorrento, desarma o pescoço.
Pão e pensamento mergulhados no café.
No horizonte do alcanço
Entre rede e beiral
O balanço
E a lua, pendurada no varal.
Coisa de lembrar.
O café mormaçando os óculos,
jaboticabeira pintada de fruta e pardal.
O pato da Índia, modorrento, desarma o pescoço.
Pão e pensamento mergulhados no café.
No horizonte do alcanço
Entre rede e beiral
O balanço
E a lua, pendurada no varal.
esse poema foi o segundo colocado no Concurso Nacional de Poemas Carlos Drummond de Andrade, 1998, Muzambinho, MG
Grata pela oportunidade,
Grata pela oportunidade,
Cláudia F Pacce
Carlos Drummond de Andrade
Wikipédia
Carlos Drummond de Andrade (Itabira, 31 de outubro de 1902 — Rio de Janeiro, 17 de agosto de 1987) foi um poeta, contista e cronista brasileiro, considerado por muitos o mais influente poeta brasileiro do século XX.1
Nasceu em Minas Gerais, numa cidade cuja memória viria a permear parte de sua obra, Itabira. Seus antepassados, tanto do lado materno como paterno, pertencem a famílias de há muito tempo estabelecidas no Brasil 2 3 . Posteriormente, foi estudar em Belo Horizonte, no Colégio Arnaldo, e em Nova Friburgo com os jesuítas no ColégioAnchieta.4 Formado em farmácia pela Universidade Federal de Minas Gerais5 , com Emílio Moura e outros companheiros, fundou "A Revista", para divulgar o modernismo no Brasil.6
Em 1925, casou-se com Dolores Dutra de Morais, com quem teve dois filhos, Carlos Flávio, que viveu apenas meia hora (e a quem é dedicado o poema "O que viveu meia hora", presente em Poesia completa, Ed. Nova Aguilar, 2002), e Maria Julieta Drummond de Andrade.
No mesmo ano em que publica a primeira obra poética, "Alguma poesia" (1930), o seu poema Sentimental é declamado na conferência "Poesia Moderníssima do Brasil"1 , feita no curso de férias da Faculdade de Letras de Coimbra, pelo professor da Cadeira de Estudos Brasileiros, Dr. Manoel de Souza Pinto, no contexto da política de difusão da literatura brasileira nas Universidades Portuguesas. Durante a maior parte da vida, Drummond foi funcionário público, embora tenha começado a escrever cedo e prosseguindo até seu falecimento, que se deu em 1987 no Rio de Janeiro, doze dias após a morte de sua filha.7Além de poesia, produziu livros infantis, contos e crônicas. Em 1987, meses antes de sua morte, a escola de samba Mangueira o homenageou no Carnaval com o enredo "O Reino das Palavras", sagrando-se campeã do Carnaval Carioca naquele ano.8
Drummond e o modernismo brasileiro
Drummond, como os modernistas, segue a libertação proposta por Mário e Oswald de Andrade; com a instituição do verso livre, mostrando que este não depende de um metro fixo.1 Se dividirmos o modernismo numa corrente mais lírica e subjetiva e outra mais objetiva e concreta, Drummond faria parte da segunda, ao lado do próprio Oswald de Andrade.1
A poesia de Drummond
Quando se diz que Drummond foi o primeiro grande poeta a se afirmar depois das estreias modernistas, não se está querendo dizer que Drummond seja um modernista. De fato herda a liberdade linguística, o verso livre, o metro livre, as temáticas cotidianas.1
Mas vai além. "A obra de Drummond alcança — como Fernando Pessoa ou Jorge de Lima, Herberto Helder ou Murilo Mendes — um coeficiente de solidão, que o desprende do próprio solo da História, levando o leitor a uma atitude livre de referências, ou de marcas ideológicas, ou prospectivas", afirma Alfredo Bosi (1994).
Affonso Romano de Sant'ana costuma estabelecer a poesia de Carlos Drummond a partir da dialética "eu x mundo", desdobrando-se em três atitudes:
· Eu maior que o mundo — marcada pela poesia irônica
· Eu menor que o mundo — marcada pela poesia social
· Eu igual ao mundo — abrange a poesia metafísica
Sobre a poesia política, algo incipiente até então, deve-se notar o contexto em que Drummond escreve. A civilização que se forma a partir da Guerra Fria está fortemente amarrada ao neocapitalismo, à tecnocracia, às ditaduras de toda sorte, e ressoou dura e secamente no eu artístico do último Drummond, que volta, com frequência, à aridez desenganada dos primeiros versos: A poesia é incomunicável / Fique quieto no seu canto. / Não ame.1 Muito a propósito da sua posição política, Drummond diz, curiosamente, na página 82 da sua obra "O Observador no Escritório", Rio de Janeiro, Editora Record, 1985, que "Mietta Santiago, a escritora, expõe-me sua posição filosófica: Do pescoço para baixo sou marxista, porém do pescoço para cima sou espiritualista e creio em Deus."
No final da década de 1980, o erotismo ganha espaço na sua poesia até seu último livro.
Carlos Drummond de Andrade (Itabira, 31 de outubro de 1902 — Rio de Janeiro, 17 de agosto de 1987) foi um poeta, contista e cronista brasileiro, considerado por muitos o mais influente poeta brasileiro do século XX.1
Nasceu em Minas Gerais, numa cidade cuja memória viria a permear parte de sua obra, Itabira. Seus antepassados, tanto do lado materno como paterno, pertencem a famílias de há muito tempo estabelecidas no Brasil 2 3 . Posteriormente, foi estudar em Belo Horizonte, no Colégio Arnaldo, e em Nova Friburgo com os jesuítas no ColégioAnchieta.4 Formado em farmácia pela Universidade Federal de Minas Gerais5 , com Emílio Moura e outros companheiros, fundou "A Revista", para divulgar o modernismo no Brasil.6
Em 1925, casou-se com Dolores Dutra de Morais, com quem teve dois filhos, Carlos Flávio, que viveu apenas meia hora (e a quem é dedicado o poema "O que viveu meia hora", presente em Poesia completa, Ed. Nova Aguilar, 2002), e Maria Julieta Drummond de Andrade.
No mesmo ano em que publica a primeira obra poética, "Alguma poesia" (1930), o seu poema Sentimental é declamado na conferência "Poesia Moderníssima do Brasil"1 , feita no curso de férias da Faculdade de Letras de Coimbra, pelo professor da Cadeira de Estudos Brasileiros, Dr. Manoel de Souza Pinto, no contexto da política de difusão da literatura brasileira nas Universidades Portuguesas. Durante a maior parte da vida, Drummond foi funcionário público, embora tenha começado a escrever cedo e prosseguindo até seu falecimento, que se deu em 1987 no Rio de Janeiro, doze dias após a morte de sua filha.7Além de poesia, produziu livros infantis, contos e crônicas. Em 1987, meses antes de sua morte, a escola de samba Mangueira o homenageou no Carnaval com o enredo "O Reino das Palavras", sagrando-se campeã do Carnaval Carioca naquele ano.8
Drummond e o modernismo brasileiro
Drummond, como os modernistas, segue a libertação proposta por Mário e Oswald de Andrade; com a instituição do verso livre, mostrando que este não depende de um metro fixo.1 Se dividirmos o modernismo numa corrente mais lírica e subjetiva e outra mais objetiva e concreta, Drummond faria parte da segunda, ao lado do próprio Oswald de Andrade.1
A poesia de Drummond
Quando se diz que Drummond foi o primeiro grande poeta a se afirmar depois das estreias modernistas, não se está querendo dizer que Drummond seja um modernista. De fato herda a liberdade linguística, o verso livre, o metro livre, as temáticas cotidianas.1
Mas vai além. "A obra de Drummond alcança — como Fernando Pessoa ou Jorge de Lima, Herberto Helder ou Murilo Mendes — um coeficiente de solidão, que o desprende do próprio solo da História, levando o leitor a uma atitude livre de referências, ou de marcas ideológicas, ou prospectivas", afirma Alfredo Bosi (1994).
Affonso Romano de Sant'ana costuma estabelecer a poesia de Carlos Drummond a partir da dialética "eu x mundo", desdobrando-se em três atitudes:
· Eu maior que o mundo — marcada pela poesia irônica
· Eu menor que o mundo — marcada pela poesia social
· Eu igual ao mundo — abrange a poesia metafísica
Sobre a poesia política, algo incipiente até então, deve-se notar o contexto em que Drummond escreve. A civilização que se forma a partir da Guerra Fria está fortemente amarrada ao neocapitalismo, à tecnocracia, às ditaduras de toda sorte, e ressoou dura e secamente no eu artístico do último Drummond, que volta, com frequência, à aridez desenganada dos primeiros versos: A poesia é incomunicável / Fique quieto no seu canto. / Não ame.1 Muito a propósito da sua posição política, Drummond diz, curiosamente, na página 82 da sua obra "O Observador no Escritório", Rio de Janeiro, Editora Record, 1985, que "Mietta Santiago, a escritora, expõe-me sua posição filosófica: Do pescoço para baixo sou marxista, porém do pescoço para cima sou espiritualista e creio em Deus."
No final da década de 1980, o erotismo ganha espaço na sua poesia até seu último livro.
----------------------------------------