#171 Wladimir do Nascimento Matta - o Juiz Mulato
Otávio Luciano Camargo Sales de Magalhães
Wladimir do Nascimento Matta é um
personagem singular na história de Muzambinho. Foi juiz de Direito em
Muzambinho e início do século XX. Foi um dos fundadores do Lyceu de Muzambinho,
junto com Salathiel de Almeida, e passou a dar aulas naquela instituição
gratuitamente de Geografia. Era um sonhador. Em Tiradentes, para onde foi após
sair de Muzambinho, também fundou uma escola.
Esquecido de Muzambinho e
Tiradentes, terminou sua vida no anonimato, com poucas homenagens.
Formado em 1889 em Direito na
Faculdade de Direito de São Paulo, atual USP, no Largo São Francisco, foi
colega do ministro do STF Edmundo Lins, que contou sua história.
Sabemos pouco sobre ele. Por Edmundo
Lins sabemos que ele era mulato. Seu avô era africano, rico, casado com uma
francesa. Talvez tenha sido o único juiz mulato em nossa história.
FUNDADOR DO LYCEU
Em 1902 ajudou Salathiel de Almeida
a redigir o regimento do Lyceu, assinando o mesmo junto com Dr. Fernando
Avelino Correia, Valério Lacerda, Dr. Luiz Paoliello e Salathiel de Almeida.
A Revista do Lyceu de 1928 nos
conta:
Nos fins do século passado, o dr. Urbano Galvão criou, nesta cidade, um
curso particular em que lecionavam ele e
o dr. Fernando Avelino Correa. Em 1901,
o dr. Urbano retirou-se de Muzambinho, razão pela qual, o dr. Fernando convidou
o dr. Salathiel Ramos de Almeida, para substituí-lo. Era um curso modesto, com
poucos alunos, numa cidade pequena. Mas a idéia grande havia surgido e, com
ela, o impulso para a sua realização. Nesse mesmo ano, ficou assentada a
criação pela Câmara de um estabelecimento de instrução secundária. E devido aos
esforços do dr.Wladimir do Nascimento Matta, do Cel. Francisco Navarro de
Moraes Salles, do dr. Fernando Correa, do dr. Salathiel de Almeida, do Cel.
Valério Lacerda e outros, foi criado o Lyceu (Lei Municipal n. 145, de 26 de
Setembro de 1901). (LYCEU, 1928)
Um prospecto
do Lyceu de 1924 também cita-o como fundador:
Em 1902, nessa datam era publicada a
lei que criava o Lyceu Municipal de Muzambinho, modesto externato onde se
ensinavam matérias primárias e português, francês, geografia, aritmética e
desenho, matérias essas a cargo dos professores Julio Bueno, Salathiel de
Almeida, Dr. Wladimir Matta e Cel. F. Navarro, tendo como o diretor o Dr.
Fernando Avelino Corrêa. Era o professor primário o Major João Batista Gomes de
Azevedo, de saudosa memória. Dois anos mais tarde, por proposta do professor
Salathiel e Almeida, era reformado e ampliado o estabelecimento, que passou a
ser dirigido pelo citado professor, tendo como seu companheiro na direção o
saudoso cônego Pedro Nolasco de Assis. Com as modificações introduzidas,
desenvolve-se o Lyceu: a sua freqüência aumenta e ampliam-se os seus cursos.
(LYCEU, 1924)
Em 1902, a
comissão organizadora escreveu assim:
“Ilmo. e Exmo.Snr. Cel. Francisco
Navarro de Moraes Salles. D.D. Presidente e Agente Executivo da Câmara Municipal
de Muzambinho.
A
comissão especial nomeada por V. Exa. Para dar parecer sobre o Regulamento, que
deve reger o Lyceu Municipal, tendo desempenhado-se do seu encargo, vem
apresentar de novo à vossa considerações, salvo pequenas modificações, o mesmo Projeto
de Regulamento que o Snr. [ilegível o título, parece Je.] Salathiel Ramos de
Almeida ofereceu à vossa Excia., e foi sujeito à nossa apreciação.
A
comissão declara achar bom o Projeto em questão, e digno de ser promulgado por
vossa Excia.
Não
obstante a cuidadosa revisão feita neste trabalho a comissão, reconhecendo sua
incompetência para analisar em seus detalhes o Projeto, é a primeira a crer que
o mesmo não esteja, talvez, de todo escoimado de defeitos, nem tão perfeito
quando se cobiça que o seja, a exigüidade de tempo havido afim de que o Snr.
[mesmo título] Salathiel de Almeida confeccionasse o Regulamento e concedido a
comissão para que o revesse atentamente, não lhes permitiu maior estudo e
meditação sobre o assunto, por isso todos os signatários deste parecer esperar
ser relevados das faltas, lacunas, e omissões que forem encontrados no Projeto
pro V. Excia. e outras pessoas.
Todavia
a comissão está convicta que, ainda mesmo que o Projeto seja repelido pelos
competentes, ao menos, por enquanto, pode afirmar que o mesmo satisfaz o fim a
que visa, quando mais não seja para que se instale o Lyceu, e então as faltas,
as lacunas, e as omissões serão melhormente verificadas em face da vida
diuturna do Lyceu, oferecendo ela assim ensejo para que outros anotando os
erros existentes neste despretensioso trabalho possam, mais tarde, firmados nos
efeitos da prática, confeccionar outro Regulamento organizado sob mais largas
vistas, e capaz de satisfazer com amplitude, de modo cabal, os intuitos de V. Excia.,
e da Ilustríssima Câmara Municipal criando um Lyceu de curso secundário neste
município.
Saúde
e fraternidade.
Muzambinho,
12 de Fevereiro de 1902.
Dr.
Avelino Corrêa, Valério Lacerda, Dr. Luiz Paolielo, Salathiel de Almeida,
Wladimir do Nascimento Matta.” (LYCEU, 1902)
POR ONDE ELE FOI JUIZ?
Sabemos
que ele foi juiz em Machado, Abre Campo, Muzambinho, Tiradentes, Carangola, Rio
Novo e Paraguaçu, cidades mineiras.
O Minas
Gerais, órgão oficial do estado, o mostra como promotor em Machado em 13 de
julho de 1893. Em 15 de junho de 1897 era juiz de direito em Machado.
O
Minas Gerais de 17 de dezembro de 1899 o aponta como juiz de Abre Campo – MG.
Uma edição
do jornal “O Muzambinho” aponta ele como 4º juiz de Direito titular da comarca,
sucedendo João Emygdio Rezende Costa, Antonio Filemon Gonçalves e Evaristo
Norberto Duarte. Foi juiz em 1902 pelo menos.
Foi juiz em Tiradentes – MG (onde
também fundou um Ginásio), substituindo seu colega de faculdade, Edmundo Lins,
que foi presidente do STF:
Dr. Lins, em 1898, instala a comarca da capital mineira e mais tarde
(1931) chega ao alto posto de presidente do Supremo Tribunal Federal. Foi Juiz
substituto do Dr. Lins, em Tiradentes, o Dr. Wladimir do Nascimento Matta, que
se dedicou a alfabetização dos adultos e presos em sua comarca. http://2013-2016.indicadores.cidadessustentaveis.org.br/br/MG/tiradentes/regiao
Em 1905 era
juiz em Carangola – MG, onde também agiu com filantropia, fundando a casa de
caridade, com outros:
No dia 08 de abril de 1905, sob o
assoalho da velha capelinha do Rosário, morreu, nesta Cidade de Carangola, à
mingua de alimento e assistência médica, Camilo Jacinto Maria, sexagenário,
mendigo, e enfêrmo. Que destino cruel, com suas agruras torturantes, arrastou
às plagas Carangolenses. A triste e dolorosa ocorrência foi habilmente
explorada pelo jornalista Antonio Carlos Themudo, diretor de “O Progressista”
que em sucessivos editoriais de seu semanário, exortou todas as classes do
município a fundar uma “Casa de Caridade”, para abrigar e socorrer os
abastardos da sorte. Encontrando terreno propício, a idéia germinou, e no dia
25 de Maio do referido ano, na residência do Dr. Manoel Santino de Castro Lobo,
reuniu-se uma comissão composta do Cônego Francisco Sabino de Filó, Vigário da
paróquia, Cel. Honório José Pereira, Presidente da Câmara Municipal, Dr.
Wladimir Nascimento Mata, Juiz de Direito da comarca, Antonio Carlos Themudo,
Diretor de “O Progressista”, e Joaquim Alves Vilela, pela redação de “O
Rebate”. Esta comissão encarregou-se a si mesma de levar de vencida tão
generosa iniciativa, com o auxílio de todos os habitantes do município, a quem
fez veemente apelo por meio dos circulares e da imprensa. Na mesma reunião
foram designados 4 sub-comissões com as seguintes finalidades: Escolha do local
da futura sede, elaborar o projeto dos estatutos, angariar donativos e
fiscalização dos trabalhos preparatórios. Para obter donativos foram ainda nomeadas
comissões em Tombos, Faria Lemos, São Francisco do Glória, Divino de Carangola,
São Sebastião da Barra, e Alto do Carangola, conforma consta na ata lavrada por
Themudo. No dia 28 do mesmo mês de Maio e a 5 do seguinte mês de junho,
reuniu-se a sub-missão encarregada do local da futura Casa de Caridade,
composta dos Doutores: Américo Arnulfo Torres, Aristóteles Dutra e Carvalho,
Arthur Marques de Oliveira e Francisco Pedro Monteiro da Silva, dando seu
parecer e colocando à disposição os seus serviços profissionais. Themudo
secretariou as duas reuniões e lavrou as competentes atas.
Aos assinantes de “O Progressista”, e
às pessoas de mais destaque do município, foram distribuídas mais de 500 listas
para angariar donativos, que renderam CR$ 1.559,30, sendo recolhidas algumas
com uma única subscrição de CR$ 0,30. José Correia de Almeida, comerciante em
Faria Lemos, fez cessão de um documento de valor CR$ 4.270,00, e o Capitão
Américo Pinto Machado contribuiu com a quantia de CR$ 2.000,00.
Nos primeiros dias de Agosto de 1905
foi aprovado em 2ª discussão, no Congresso Estadual o projeto de Heitor de
Souza, Deputado pelo Distrito de Carangola, autorizando a cessão do prédio da
cadeia à Casa de Caridade; e, a 27 de setembro era sancionada a lei nº 419,
votada pelo Congresso do Estado, autorizando o governo a fazer a cessão
gratuita à Câmara Municipal de Carangola, do prédio que serviu durante 06 anos
de cadeia, para em o mesmo ser instalada a Casa de Caridade.
O Minas Gerais de 15 de Agosto de
1906, publicava o seguinte decreto: O Doutor Presidente do Estado de Minas
Gerais, de conformidade com a lei nº 419 de 27 de setembro de 1905, resolve
ceder à Câmara Municipal de Carangola, o prédio que serviu como cadeia local,
para que seja nele instituido um hospital de caridade. Palácio do Presidente do
Estado de Minas Gerais, em 14 de Agosto de 1906.
Francisco Antônio de Sales
Antonio Carlos Ribeiro de Andrada
Em Dezembro do mesmo ano, estava
disponível o prédio em virtude da transferência dos 36 presos para a nova cadeia
local, e a firma Fraga & Sobrinhos, oficia à comissão, oferecendo-se a
fazer no prédio a limpeza e alterações necessárias e a concorrer para aquisição
do mobiliário.
O Referido prédio, desapropriado pela
prefeitura há poucos anos, e já demolido, fazia esquina com a Rua Padre Cândido
e Praça Presidente Getulio Vargas. Nele funcionou a Casa de Caridade até 1922,
ano em que se transferiu para sua atual sede.
No dia 24 de Fevereiro de 1907 na sala
de sessões da Câmara Municipal, reuniram-se as diversas comissões e
sub-comissões sob a presidência do Dr. Cleto Toscano Barreto, estando presentes
22 pessoas que assinaram o livro de presença e se inscreveram como membros da
sociedade, sendo apresentados, discutidos e aprovados os Estatutos da Casa de
Caridade de Carangola. No dia 03 de Março seguinte, realizou-se especialmente
convocada, a assembleia geral que elegeu a seguinte primeira diretoria:
o Provedor:
Dr. Manoel da Cruz
o Vice-provedor:
Dr. João Batista Neves
o Dr.
Olimpio Teixeira
o Secretários:
Felisberto José Garcia
o Benjamin
Vieira Barros
o Tesoureiro:
Manoel Pedro Lourenço
o Mordomos:
Augusto Mateus
o João
José Duarte
o Capitão
Olímpio J. Machado
o Joaquim
M. Ferreira Neto
o Dr.
Josias Vilela de Azevedo
o Múcio
Martins Vieira
o Dr.
João C. Carvalho Vidigal
o Natale
Lanzarotti
o Breno
Alves da Mota
o José
Augusto Albuquerque
o Major
Aristides Barroso
o Carlos
Augusto de Carvalho
Assim nasceu a Casa de Caridade de
Carangola, instituição modelar e bem aparelhada, apontada sem favor, como maior
centro cirúrgico de nossa vasta região.
Atraídos pela eficiência de todos os
seus serviços, a ela convergemos doentes e indigentes de todos os municípios
vizinhos de nosso estado, e dos estados do Espírito Santo e do Rio de Janeiro.
Possui, presentemente 52 leitos para
indigentes de ambos os sexos e 30 para doentes particulares. Tem em adiantada
construção um novo pavilhão de dois pavimentos para indigentes, uma suntuosa e
moderna Maternidade de três pavimentos e um lactário.
Casa de Caridade de Carangola – há mais de 100
anos cuidando de sua saúde e de sua família!
Em 1912 era juiz em Rio Novo – MG,
conforme notícia de 17 de novembro, sobre a instação do distrito de Goyaná.
Goyaná - Por Decreto n.º 3751 marcou o governo do Estado o dia 24 do
corrente para a installação desse districto. - Em outra parte desta folha a
comissão encarregada de promover os festejos para aquella solenidade, dirige ao
povo do município um convite geral afim de que ao acto possam assistir todos
quantos desejarem. - Tomará parte na festa, a Banda de Música do 2.º Batalhão
da Força Pública, que virá de Juiz de Fora no trem da manhã. - A posse das
autoridades locais será dada (pelo) venerando e íntegro Wladimir Matta, Juiz de
Direito da Comarca, ao meio dia, no centro da povoação, havendo em seguida a
missa e benção inaugural do districto, celebrada pelo Revmo. Senhor Padre Luiz
Conrado Pereira. - Deverá correr neste dia, ligado ao trem da carreira, um
carro especial posto pelo senhor Comendador Cassimiro Costa, à disposição dos
convidados de Juiz de Fora, Rio Novo e estações intermediárias."
O Jornal do Rio Novo também o cita em
1º de dezembro de 1912, sobre a mesma solenidade, conforme conta: http://jornaldegoiana.blogspot.com.br/2008/03/coluna-cultural.html
Em 1916 era juiz em Rio Novo - MG,
publicando no Jornal do Comércio de 28 de maio, 3, 4 e 6 de junho de 1916, o
artigo "Liberdade Profissional - Sentença e Estudo". O texto foi
transformado pela Câmara Municipal de Rio Novo, em 1916.
Veja que era um juiz produtivo,
fundou 2 escolas (Muzambinho e Tiradentes), ajudou a fundar um hospital,
escreveu artigos e discursou na inauguração do distrito de Goianá. Alfabetizou
presos e adultos, mostrando ser vanguardista.
WLADIMIR DO NASCIMENTO
MATTA PELO MINISTRO EDMUNDO LINS
Reminiscências da Vida Pública
DR. WLADIMIR DO NASCIMENTO MATTA
Contou minha turma, na
Escola de Direito de São Paulo, muitos elementos de valor. Vários se
destacaram, na vida pública do pais, como, entre os mortos, João Luiz Alves,
Carlos Peixoto, Herculano de Freitas, Emilliano Pernetta, e, entre os vivos,
Francisco Mendes Pimentel, Edmundo da Veiga, Francisco Brant, Pedro da Matta
Machado, Paulo Prado, Hippolito de Araújo, Americo Ludolf, Camillo Soares de
Moura e Affonso de Carvalho, citando apenas alguns.
Dos já falecidos,
poucos sobrescederam a Wladimir do Nascimento Matta, que, aos atavios do
espírito, reunia ainda a mais peregrina bondade.
Natural do Rio de
Janeiro, era filho do Dr. José Pereira do Nascimento Matta, advogado desta Capital,
onde fez grande fortuna ampliando os bens herdados de seu pai, um preto
africano de tamanho talento e de tão excepcional capacidade de trabalho que se
tornou importante proprietário no Rio de Janeiro, chegando a ser agracidado,
pelo Imperador, com a comenda da Ordem da Rosa. Casara-se com esse africano em
segundas núpcias, com uma senhora parisiense, que contratara para preceptora
das filhas de seu primeiro casamento. Do matrimônio com essa parisiense houve o
pai de Wladimir Matta. Matriculou-se este comigo na escola de Direito de São
Paulo em 1883 e foi durante todo o curso, meu amigo íntimo e companheiro de
quarto.
Pude assim, nos anos
da mocidade, em que o homem ainda não aprendeu a dissimular, apreciar-lhe de
perto os invulgares dotes morais e intelectuais.
Ao formar-se, em 1889,
disse-lhe o pai que não precisava preocupar-se com a profissão, pois, sendo
rico, bastava consagrar-se a administrar os próprios haveres, que lhe dariam de
início, um conto de réis por mês, quando que na época, proporcionava uma vida
de nababo.
Não se conformou,
porém, Wladimir com o alvitre paterno.
Após uma viagem
empreendida à Europa afim de ampliar a sua cultura, chegando a frequentar
diversos dos mais famosos cursos da Faculdade de Medicina de Paris, como os de
Charcot e Bouchard, regressou ao Brasil fazendo questão de manter-se com a sua
carta de bacharel.
Exercia eu o cargo de
Juiz de Direito de São José d'El Rei hoje Tiradentes, quando dele recebi uma
carta em que me pedia interferisse no sentido de obter-lhe o lugar de Juiz
substituto de minha comarca, então vago, o que foi conseguido.
Em São José d'El Rei,
alem da mais completa exação no cumprimento de suas obrigações como juiz
substituto. Wladimir Matta demonstrou ainda imensa bondade.
Sendo um homem extremamente
fino, caracterizando-se pela elegância com que se trajava, preocupando-se muito
com o asseio e a limpeza de tudo quanto o cercava, não trepidou em abrir, todos
os domingos, uma aula para os presos da cadeia municipal. Condoido da insipidez
em que passavam as interminaveis horas do cárcere, teve a inspiração de
explicar-lhe o Envagelho, fazendo-o com a abnegação de um sacerdote, e como
mérito tanto maior quanto era um incréu.
Ao verificar que
muitos dos encarcerados não podiam acompanhar a leitura por serem analfabetos,
desdobrou a explicação do Evangelho em aula de primeiras letras, onde lhe
ensinava a ler, contar e escrever.
E, não contente,
resolveu abrir em sua própria casa um curso gratuito e noturno - Liceu
Tiradentino - para quantos analfabetos quisessem frequentá-lo.
Exercendo sobre si
mesmo o maior domínio, ele que era atormentado pela manomania do asseio,
passava horas na companhia de homens do povo cobertos de imundos andrajos.
Raros santos o
excederam, assim, na força de vontade com que subjugava as fragilidades e
caprichos do corpo.
Quanto à sua
integridade como juiz basta narrar o seguinte fato que confirma, o prolóquio
dos Romanos - "Magistratus indicat virium" - o exercício da
magistratura dá a conhecer o varão que nela se acha investido.
Havendo o fazendeiro
mais importante da Comarca feito raspar a cabeça de um empregado, dando-lhe,
demais, uma duzia de bolos por ter sido malcreado para com uma de suas filhas,
Wladimir Matta, ao sabê-lo, imediatamente abriu inquérito, instaurou processo e
pronunciou-o, sem considerar que atrairia contra si a ira implacavel de um
chefe político de prestígio.
Tal fama de severidade
e independência angariou, que os desocupados e capangas dos arraiais da
Comarca, quando sabiam que ele se achava nas redondezas, fugiam e passavam a
dormir ao relento na mata.
Valendo-se de seus
conhecimentos médicos hauridos na Escola de Medicina de Paris, e sempre
municiado de uma caixa completa de remédios homeopatas, atendia a todos os
doentes pobres de São José d'El Rei e imediações, medicando-os e
fornecendo-lhes alimentos.
Foi, portanto, um
homem pouco comum pela bondade e retidão do caráter.
Aposentando-lhe,
depois de percorrer várias comarcas de Minas, faleceu no Rio esquecido e
ignorado.
Por ocasião de seu
passamento, nenhuma demonstração de carinho e gratidão recebeu de seus antigos
jurisdicionados, aos quais tanto bem fizera.
Até hoje jaz esquecido
dos habitantes de Tiradentes, que não se lembraram e de certo não se lembrarão
jamais de honrar uma das ruas de sua cidade com o nome desse ser grande
bemfeitor.
Eis porque, como
homenagem da maior estima, da mais sincera admiração e da maior saudade lhe
consagro esta reminiscência, a qual podera servir para estimular outros a
praticarem o bem apenas pelo amor do próprio bem, sem se preocuparem com a
retribuição, e, pelo contrário, contando, como certa, com a ingratidão daqueles
que lhe receberem os benefícios.
Rio,
6 de Outubro de 1942
Edmundo
Lins
Jornal do Comércio 18(?)-10-42
(O
texto acima está publicado no site do Supremo Tribunal Federal)
A Plataforma Hélio Gravatá mostra a
relação de amizade de ambos:
WLADIMIR MATTA KARDECISTA
O Dr. Wladimir do Nascimento Matta, por torno de 1891,
10 anos antes de estar em Muzambinho, escrevia para o jornal da Federação
Espírita Brasileira, o jornal “O Reformador”.
Veja o texto de novembro de 1891:
COMPROMISSO DO GRUPO FÉ,
AMOR E CARIDADE - 1º. - Exforçar-se cada um na medida de suas forças para
promover o seu próprio adiantamento moral e intellectual, segundo o ensino da
doutrina spirita. 2º. - Trazer para pertencer ou visitar o Grupo somente
pessoas de reconhecida boa vontade. 3º - Sujeitar-se com dedicação aos estudos
theoricos e praticos, não praticando a mediumnidade fóra do Grupo, sinão quando
estiver completamente desenvolvido e apta para a especialidade qua manifestar.
Facto - Sr. Dr. Wladimir Matta - Vou expor-lhe um
facto singular passado commigo ha cerca de 31 annos: mas não obstante ter já
decorrido tanto tempo ainda assim delle me recordo como si tivesses succedido a
noite ultima.
Fui casada em primeiras nupcias uns tres annos, findo
os quaes meu marido sucumbiu de uma molestia lenta dos pulmões, não obstante
todos os cuidados prodigalisados a ver si o arrancavamos a tão cruel
enfermidade; infelizmente, porém, mais poude o fatal elemento morbido do que a
medicina, e no fim de um anno de tristes previsões meu marido exbalou o último
suspiro na data de 3 de Novembro de 1860.
Viuva então, tendo n'alma as recordações de quem tão
cedo se apartava de mim, procurava lenitivo para meu infortunio nos actos de
recolhimento que todos sabemos encontrar na religião, e em minhas orações
invariavelmente dirigia ao Creador algumas pelo repouso do meu finado
companheiro.
Uma noite aconteceu ficarem em meu quarto varias
pessoas da familia, si bem que eu ja estivesse deitada de vez para dormir, e
realmente, emquanto conversavam, fui sorprehendida pelo somno de tal modo
profundo que dormi sem orar e não vi quando estas pessoas da familia
recolheram-se aos seus aposentos, excepto porém minha mãe que passou a dormir
no meu quarto desde que fiquei viuva.
Nesta noite fazia uma mez que meu marido tinha
morrido.
Por volta das duas horas da madrugada (mais ou menos,
porque não posso precisar a hora, visto como não tomei nota na occasião), fui
despertada por um ruido junto ao meu leito assemelhando-se a jornaes que eram
amarrotados; ouvi também como passadas em torno do meu leito; uma cadelinha de
estimação chamada negrinha, a qual dormia todas as noites em uma pequena cama
feita sobre cadeiras, contra os seus habitos, começou a mover-se inquieta sobre
sua cama e a uivar chorosa como sempre costumava a fazer desde que sentia o seu
fallecido amo e amigo chegar do seu trabalho e depois que lhe era aberta a
porta esta mesma negrinha o festejava por algum tempo com saltos e correrias de
alegria; abrindo então os olhos reparei que a luz da lamparina, contra o
costume, tinha diminuido, consideravelmente de intensidade, estando-se por esta
causa quasi na mais completa escuridão.
Quando percebi isso, o primeiro sentimento que tive
foi o do médo, e a primeira idéa a de não ter podido orar como de costume, por
causa das pessoas que vieram conversar no quarto, pelo que cobri minha cabeça
com os lençoes e entreguei-me toda a orações, terminadas as quaes senti me mais
alliviada do temor de que estava possuida.
Mas poucos instantes apóz, senti como que alguma
coisa subir em meu leito, a principio suppuz ser a negrinha e levei, para
verificar, a mão ao logar do leito onde julguei que ella tivesse pulado, nada
porém encontrei.
Tendo-me conservado novamente em tranquilidade, senti
pouco depois como que um braço circumdar-me o corpo e apertar-me em estreito e
terno abraço; a impressão que tive nesse instante foi talvez a do terror e d'ahi
por diante empreguei todos os esforços para conciliar o somno, o que de facto
consegui, vindo só a despertar pela manhã na hora habitual.
Emquanto me preparava, estando tambem minha mãe de
pé, perguntei a ella si nada tinha ouvido durante aquella noite, e ella
respondeu-me: menina, eu ouvi tudo, porém nada te queria contar pensando que
tivesse dormido toda a noite, mas visto teres estado acordada tão bem como eu,
tenho a dizer que vi a lamparina quasi se extinguir de todo, vi a negrinha
mover-se agitada em sua ama e nivar chorosa como quando anciosa esperava que
teu marido entrasse na rua, e ouvi movimentos de passos em roda de tua cama.
Nunca tive quer antes, quer depois, outro facto
singular como este que lhe acabo de narrar, mas deste ainda tenho bem gravado
na memoria tudo tal como si elle fosse de data recentíssima; nunca fui medrosa
e nunca soffri de molestia alguma nervosa, confio bem na integridade dos meus
sentidos e por isso o mais que poderei dizer é que não sei explicar o facto que
vos narrei, mas jamais o julgarei como illusão, hallucinante ou qualquer outra
cousa similhante.
Nada mais lhe posso informar, Sr. Dr. Matta, e o
testemunho de minha mãe não me é infelizmente, possível lhe enviar, pois ha
cerca de seis annos ella falleceu.
Por motivos particulares espero que guardará sigillo
sobr emeu nome, cumprindo assim sua promessa: poderá, porém, fazer o uso desta
carta que muito bem lhe aprouver.
Como sempre so sua
B. P.
-
Sr. Redactor - Incluso remetto a carta supra e peço,
si possível fôr, inseril-a nas collumnas do seu conceituado Jornal.
Si conseguir receber as narrações escriptas que
muitas pessoas de digno conceito, me prometteram enviar, as irei, por minha
vez, remettendo a V, afim de dar-lhe a devida publicidade, caso sejam merecedoras
disso.
Na comunicação que hoje vos endereço creio que ha a
salientar-se, a bem da sciencia, as seguintes circumstancias:
1º Ella foi auditiva para as unicas duas pessoas que
estavam no quarto (passos e papeis amarrotados).
2º Ella actuou sobre o tacto de uma das senhoras (o
abraço).
3º Apesar das duas senhoras terem percebido tudo e
uma d'ellas, pelo menos, ter tido bastante medo, ainda assim nenhuma quiz
fallar ou levantar-se para tranquillizar-se sabendo a outra acordada, ora esse
silencio não é natural, tenho notado na maioria dos casos esta singularidade da
influencia das manifestações sobre a volição dos passivos conservando-lhes no
entando a mais completa integridade e liberdade quer moral que intellectual.
4º A cadelinha também tudo percebendo como provou
patentemente pelo modo por que procedeu contra seus habitos nessa memoravel
noite, é uma circumstancia bem valliosa e significativa.
Desejando-lhe, Sr. Redactor, saude e felicidade, sou
seu.
Amº
Sincero
WLADIMIR
MATTA
Em junho de 1891 também encontramos uma nota:
Correspondencia do estrangeiro - Do Sr. Dr. Wladimir Matta, nosso
correspondente em Pariz, acaba a Federação de receber sua segunda missiva.
Eil-a:
<<Duas vezes
me dirigi à rua Trévise, em procura do Sr. Papus, para felicital-o, em nome da
Federação, pelas obras que o insigne escriptor e propagandista tem publicado em
pról da realidade positiva de numerosos factos encarados por grande numero de
homens como productos de imaginação exaltada, ou como effeitos do acaso.
<<Em nenhuma
das vezes tive a felicidade de encontral-o; da segunda, porém, mais venturoso,
foi recebido pelo Sr. L. Mauchel, illustre e amavel secretario do Grupo
Independente de Estudos Esotericos, o qual não só desculpou-se por não achar-se
presente o Sr. Papus, como agradeceu os comprimentos, promettendo
apresentar-lh'os, e, em excesso de gentileza, offereceu-me um convite para
assistir à primeira conferencia, realisada pelo Grupo na sexta-feira, 24 de
Abril, e da qual era orador o mesmo Sr. Papus.
<<Deveis
avaliar a satisfação com que retirei-me, pois ia realisar de uma só vez dous
não pequenos desejos: conhecer o Sr. Papus, e ouvir a sua palavra em uma
conferencia.
<<Com
effeito, no dia e hora aprazados, tomei logar na sala das conferencias. Cerca de
uma centena de pessoas enchia o salão. À hora pontual foi declarada aberta a
sessão, e o Sr. Papus, usando da palavra por mais de uma hora, dissertou contra
as idéas expendidas no recentissimo livro intitulado Là Bas, livro que critica
e contraria não só as opiniões dos esotericos como também a dos spiritas.
<<Além da
brilhante refutação do erudito orador, tive occasião, logo em principio, de
reparar na facil e attrahente locução de que é dotado. O Sr. Papus é ainda
jovem; contará, quando muito trinta e tantos annos; muito affavel e sympathico.
<<Ao terminar
sua conferencia, foi saudado por uma verdadeira ovação de palmas e
felicitações.
<<Vi que era
meu dever aproveitar o ensejo para tambem cumprimental-o em nome da Federação;
confesso, porém, que senti-me acanhado, por causa do numeroso auditorio
<<Antes de
começar a sessão, foi distribuido o jornal Le Voile d'Isis, órgão do Grupo de
Estudos Esotericos, que remetto com esta. Chamo a vossa attenção especialmente
para o artigo de fundo, em que o proprio Sr. Papus definiu sua attitude em
relação ao Spiritismo.
<<Quizera
dispôr de tempo para dizer ainda algumas palavras sobre a illustre commissão da
Sociedade de Psychologia e Physiologia que tem de emittir parecer sobre os
factos ainda mal deterinados de pessoas crerem ver ou ovuir pessoas ausentes.
<<Esta
commissão é composta dos seguintes sabios: Sully-Prudhomme, da Academia
Franceza, presidente; G. Ballet, aggregado à Faculdade de Medicina de Paris;
Besanis(?), professor da Faculdade de Medicina de Nancy; L. Mavillier, director
das conferencias na Escola Pratica de Altos Estudos; Ch. Richet, professor da
Faculdade de Medicina de Paris; e o Coronel A. de Rochas, administrador da
Escola Polytechnica.
<<Li esta
noticia na Revista de Hypnotismo e de Psychologia Physiologica, com a qual fui
honrado pelo redactor-chefe, meu eminente mestre na Escola de Medicina, Dr.
Edgar Bérillon.
<<Faço ponto
aqui, promettendo entretando satisfazer vossa curiosidade, continuando a
pôr-vos ao corrente do que de mais importante para a nossa causa
occorrer.>>
WLADIMIR MATTA RECEBENDO POESIA DE
EMILIANO PERNETA
Fonte: SANTANA,
IVAN JUSTEN. Emiliano Perneta: Vida e
Poesia da Província. Volume Anexo: Poesia Completa de Emiliano Perneta. Anexo
à tese apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Doutor em
Letras – Estudos Literários, Pós Graduação em Letras, Setor de Ciências
Humanas, Letras e Artes. Curitiba: UFPR, 2015.
Emiliano Perneta foi um importante
poeta brasileiro e um dos fundadores do Simbolismo no país, nasceu na Zona
Rural de Curitiba, no sítio Pinhais, e estudou na sala de Wladimir Matta na
Faculdade do Largo de São Francisco (veja a Wikipédia, que ele é da mesma turma
da Faculdade de Wladimir, o que explica o poema).
Fonte:
Antônio Miranda
JOSÉ PEREIRA DO NASCIMENTO MATTA
Sobre o pai do Dr. Wladimir Matta, encontramos ele em
algumas fontes:
·
Almanak Laemmert,
de 1900, 1901 e 1902, aponta ele como advogado residente no Largo da 2ª Feira,
S. Francisco Xavier, 3.
·
Sabemos que ele
foi formado na Faculdade do Largo São Francisco, assim como o filho. O nome
dele consta da edição 1886 da edição de “Correio Paulistano” do ano de 1862, na
página “Lista das faltas dos estudantes dadas até o último de Julho de 1862”.
Como aluno do 3º ano e 0 faltas no 1ºC e 1 falta no 2ºC.
·
O Diário Oficial
da União em 1º de outubro de 1911 e outras, aparece seu nome na lista de
negociantes registrados na Junta Comercial da Capital Federal.
·
O Diário do Rio
de Janeiro, de 7 de dezembro de 1864 anuncia sua formatura:
ODUVALDO MATTA
TEXTO I –
PORTAL TERRA
Livro reúne
poesias, cartas e peças teatrais apaixonadas de Oduvaldo Matta
Esse ano, em sua homenagem, seu filho e seu bisneto
estão lançando a obra
10 JUN2017
A obra Sob a Luz de Antares, de Oduvaldo Matta, reúne
seus mais belos textos escritos entre 1940 e 1977. Esse ano, em sua homenagem,
seu filho e seu bisneto estão lançando a obra, repleta de reflexões sobre a
humanidade, os sentimentos que nos rodeiam, religiões, vida e morte, que enchem
de paz os corações dos leitores.
Oduvaldo Matta foi um estudioso químico e dedicou-se ao
magistério, tendo fundado com sua esposa o Ginásio Wladimir Matta, na Tijuca,
Rio de Janeiro. A paixão pelas letras e pela arte de educar foi inspirada pelo
pai, juiz de direito no interior de Minas Gerais no final do século XIX, que
ministrava aulas do Evangelho para presos e abriu um curso gratuito em sua
própria casa para analfabetos, deixando clara toda a sua sensibilidade com o
próximo. O nome do pai virou o nome do colégio.
O
compilado de textos de Oduvaldo é encantador, podendo ser apreciado por
qualquer apaixonado por poemas - ou por qualquer um que queira cair de amores
lendo uma obra. Predominantemente romântico, Sob a Luz de Antares, de fato, é
uma obra prima, escrita com palavras rebuscadas de meados do século XX, o que
desperta uma onda de amor dentro de nós.
Sobre o autor: Oduvaldo do
Nascimento Matta (1903-1977), químico industrial e educador, foi casado com
Antônia de Santa Rita Matta. Natural de Minas Gerais, viveu no Rio de Janeiro,
onde por décadas foi diretor de colégio, e morou em Campos dos Goytacazes,
onde, na Estação Geral de Experimentação, realizou estudos visando dar suporte
técnico à indústria açucareira.
Fonte: Dino
TEXTO I - SOB A LUZ DE ANTARES – ADAPTADO DO TERRA
SOB A LUZ DE ANTARES
Poesias, cartas e peças teatrais de Oduvaldo do
Nascimento Matta
A obra Sob a Luz de Antares, de Oduvaldo Matta, reúne seus mais belos
textos escritos entre 1940 e 1977. Esse ano, em sua homenagem, seu filho e seu
bisneto estão lançando a obra, repleta de reflexões sobre a humanidade, os
sentimentos que nos rodeiam, religiões, vida e morte, que enchem de paz os
corações dos leitores.
Oduvaldo Matta foi um estudioso químico e dedicou-se ao magistério,
tendo fundado com sua esposa o Ginásio Wladimir Matta, na Tijuca, Rio de
Janeiro. A paixão pelas letras e pela arte de educar foi inspirada pelo pai,
juiz de direito no interior de Minas Gerais no final do século XIX, que
ministrava aulas do Evangelho para presos e abriu um curso gratuito em sua
própria casa para analfabetos, deixando clara toda a sua sensibilidade com o
próximo. O nome do pai virou o nome do colégio.
O compilado de textos de Oduvaldo é encantador, podendo ser apreciado
por qualquer apaixonado por poemas – ou por qualquer um que queira cair de
amores lendo uma obra. Predominantemente romântico, Sob a Luz de Antares, de
fato, é uma obra prima, escrita com palavras rebuscadas de meados do século XX,
o que desperta uma onda de amor dentro de nós.
O livro traz ainda um capítulo dedicado às peças teatrais escritas por
Oduvaldo para serem encenadas em ocasiões festivas pelos alunos do Ginásio
Wladimir Matta. Dentre elas, destaca-se Alvorada, drama em louvor dos veteranos
da Força Expedicionária Brasileira. A peça foi encenada pelos alunos do
terceiro ano do colégio em 1945, com o retorno do primeiro escalão da FEB,
vitoriosa na Segunda Guerra Mundial. Merece especial homenagem na emocionante
obra uma prima do autor, Helena Ramos, enfermeira das tropas brasileiras
durante a campanha da Itália.
Sobre o autor:
Oduvaldo do Nascimento Matta (1903-1977), químico industrial e educador,
foi casado com Antônia de Santa Rita Matta. Natural de Minas Gerais, viveu no
Rio de Janeiro, onde por décadas foi diretor de colégio, e morou em Campos dos
Goytacazes, onde, na Estação Geral de Experimentação, realizou estudos visando
dar suporte técnico à indústria açucareira.
TEXTO II
Poesias,
Cartas e Peças Teatrais de Oduvaldo do Nascimento Matta
Obra completa
disponível para compra no site da Pátria Filmes
Organização: Luiz de Santa Rita Matta, Olímpio Santa Rita Mata, Daniel
Mata Roque, Alvorada
Drama em louvor ao Expedicionário e à Enfermeira brasileiros, de
Oduvaldo N. Matta, com a colaboração dos professores Alvacyr Pedrinha, Glória
Futuro, Belkiss Machado e Eví Monteiro, dedicado pelo autor à Enfermeira
Expedicionária HELENA RAMOS.
Escrito em 27 de junho de 1945 e representado na festa artística com que
a ESCOLA COMERCIAL WLADIMIR MATTA homenageou à FEB e àquela Enfermeira, em sua
sede, no dia 8 de julho do mesmo ano.
Discurso Introdutório
Exmas. Autoridades,
Enfermeira Expedicionária Helena Ramos,
Expedicionários,
Enfermeiras Expedicionárias,
Minhas senhoras e meus senhores,
A Escola Comercial Wladimir Matta, representando o
pensamento unânime dos seus diretores, professores, alunos e funcionários,
associa-se jubilosamente ao sentimento nacional de justo orgulho e admiração
pela gloriosa Força Expedicionária Brasileira, promovendo esta solenidade, com
que a homenageia, na pessoa dos seus lídimos representantes aqui presentes,
recentemente regressados da frente de batalha, onde elevaram ainda mais, entre
as nações, o nome do Brasil.
Desta forma pois e dentro das suas modestas
possibilidades, procura cerca-los hoje do carinho, solidariedade e estima, de
que são legitimamente merecedores, pelo muito que sofreram e realizaram, em
favor de todos nós e em defesa da Pátria.
Nunca será demasiado, portanto, que enalteçamos o valor
dos seus feitos no teatro da guerra europeu, onde, continuando as nossas
tradições de bravos, escreveram páginas inesquecíveis da nossa história
militar, na cruenta campanha de redenção do mundo.
Tanto agora, como no futuro, será sempre um justo
motivo de orgulho nacional, relembrarmos as brilhantes e sucessivas vitórias
obtidas pela F.E.B., na frente italiana, graças aos esforços conjugados da precisão
do comando com a bravura inexcedível do Pracinha, que culminaram em Monte
Castello e na captura da 148ª divisão alemã, completa, em habilíssima e notável
ação tática.
Mas, isto não é tudo. Além da ação militar ela
desempenhou também uma missão político-social da mais alta relevância.
A FEB. foi a voz altissonante, em meio o conflito
desencadeado, em que periclitava a civilização, falando ao mundo que o Brasil
aceita a guerra se esta lhe é imposta, mas que a repudia tanto quanto repudia
ao fascismo escravizador de povos e fomentador de guerra; que o Brasil não
aceita formas políticas que se fundamentam na pretensa superioridade racial,
nem admite a violência como sistema de relação entre os povos; que o Brasil é
cioso das suas tradições de liberdade, justiça, cooperação e mútuo respeito,
que os nossos maiores construíram e nos legaram; que o Brasil condena
formalmente o recurso às armas para a solução dos problemas territoriais,
econômicos e políticos, que possam surgir entre as nações; que o Brasil é um
país livre, amante da liberdade, união e fraternidade dos povos, único caminho
que os conduzirá à vida digna, tranquila e feliz.
Ela foi a portadora da mesma voz com que, tantas vezes,
o Brasil tem falado ao mundo pela boca de Tiradentes e Patrocínio, Rio Branco e
Ruy Barbosa e que agora mesmo se fez ouvir de novo, pela palavra de Leão Veloso
em São Francisco.
Tal foi o papel que, no cenário do mundo, coube ao
Expedicionário.
Não menor, entretanto, foi o da Enfermeira que o
acompanhou nessa jornada heroica pelos campos e cidades da velha e atormentada
Europa, levando-lhe, corajosamente, o apoio moral e a assistência da mulher
brasileira, sem os quais teria sido incompleto o seu esforço.
Sim, ela o completou. Se o Expedicionário foi a força,
a ação rápida e eficiente, que se opôs como um dique à onda do nazismo que
ameaçava se espraiar pelo mundo, como um flagelo, a Enfermeira foi sem dúvida o
sentimento, a abnegação, a renúncia, postos ao seu serviço, para mitigar as
suas dores, reconfortá-lo no sofrimento e subtraí-lo à morte muitas vezes,
multiplicando-lhe, portanto, o valor.
Ela foi bem a síntese da família de que tanto se
afastara, na extensa caminhada, o Pracinha valente.
Suas mãos reuniam, a um tempo, amor materno e desvelos
de esposa, amizade de irmã e ternura de noiva, quando nos hospitais de
campanha, tão distantes do lar, pensavam os ferimentos nas carnes
ensanguentadas dos que iam tombando, no fragor da terrível acometida.
Os cegos, os estropiados, os alucinados, todos esses
brasileiros que se desgraçaram na guerra que o nazismo deflagrou, apoiaram em
suas mãos os seus corpos destroçados, para um triste e penoso caminhar.
Foram ainda as suas mãos amigas que, num último e
piedoso gesto de humanidade, cerraram os olhos dos que não puderam sobreviver e
assinalaram com uma singela cruz o local, no solo italiano, onde dormem os seus
corpos.
Enfermeira Expedicionária Helena Ramos. Minha concidadã e minha prima.
Permiti que eu vos veja neste momento, como um símbolo,
reunindo em vós todas as vossas companheiras de tão patriótica e altruísta
tarefa, para que em dizendo a vós, eu o possa dizer também a todas as
Enfermeiras, que como brasileiro, como pai, como diretor desta Escola, eu me
orgulho de vós, eu vos admiro, eu vos agradeço.
Oduvaldo do Nascimento Matta.
Personagens e
Intérpretes
(por ordem de entrada em cena)
A PAZ………… Aluna: Sônia Silva Fernandes – 1ª série comercial
A INFÂNCIA……. Conjunto de alunos do curso primário (bailado): Maria
Lígia Pimentel, Maria Alice Corrêa, Zélia e Olindina Medeiros, Elza Marques,
Nara Ferraz, Marta Geoffrey e Wanda Figueiredo.
A HUMANIDADE….. Aluna: Célia Neves de Moura – 2ª série comercial
O EXPEDICIONÁRIO. Aluno: Olímpio de Santa Rita Matta – 3ª série
ginasial, do Colégio São José
A ENFERMEIRA HELENA RAMOS….. Aluna: Jenny Barbosa Leite – 1ª série
comercial
A PÁTRIA……… Aluna: Maria Lezí de Araujo – 2ª série comercial
A NOVA GERAÇÃO… Alunos: Júlio Forster da Costa e Sarita Barzellay – 1°
ano primário
AS NAÇÕES UNIDAS. Alunas: Irma Zilberberg (Inglaterra), Teresa
Zilberberg (Polônia), Nilda Caldas (França), Nazira Petrus, substituindo Isabel
Lopes (Yugoslávia), Marlene Del Peloso (China), Miriam Machado (Norte- América)
e Miriam Rodrigues (U.R.S.S.)
Época: Atualidade.
Cenário: Nas cercanias de Monte Castello, na Itália.
PRÓLOGO – 1ª
CENA
Surge a Paz - Vestuário: túnica branca – Fisionomia: confiante, feliz –
Voz: clara, cantante, com entusiasmo – Gestos: largos, condizentes com a voz e
o assunto – Local do palco: borda do palco, por fora do velário, que se mantém
cerrado enquanto declama – Música para o fundo da declamação: “A Lenda do Beijo
– Intermezzo”, de Sotullo e Vert.
Oratória:
A PAZ
Ouço, ecoando nas encostas, o cântico das enxadas,
cavando no seio do solo fértil, o berço das sementes.
Em breve, a terra trabalhada se cobrirá de espessas ramagens,
recompensando os esforços do amanho com a fartura das colheitas.
Cheias de serena majestade, fumam as chaminés das
fábricas, em cujas entranhas, trabalham as máquinas na feitura das utilidades,
que a todos vão beneficiar.
Ouço nas oficinas um hino ao trabalho, que os martelos
cantam nas bigornas.
Nas escolas, a ciência, como um sol, vai iluminando a
mocidade que surge estuante e esperançosa para a vida, enquanto a infância
canta descuidada os seus folguedos.
ABRE-SE O VELÁRIO – NO PALCO EM GRUPO ARTÍSTICO PARA O BAILADO A
INFÂNCIA
Então, em toda parte, sob a minha inspiração, o amor,
numa linguagem conhecida de todos os homens, vai recitando alegremente em cada
coração o divino preceito:
“AMAI-VOS UNS AOS OUTROS”.
INICIA-SE O BAILADO INFANTIL. DESENVOLVIMENTO DO MESMO ATÉ SEU FINAL.
RUÍDOS DE AVIÕES QUE PASSAM BOMBARDEANDO. DEFLAGRAÇÃO DA GUERRA.
FIM DO BAILADO: AS CRIANÇAS FOGEM ASSUSTADAS, LEVANDO CONSIGO A PAZ, QUE
ATÉ ENTÃO PERMANECIA A UM CANTO DO PALCO
ASSISTINDO À CENA.
PRÓLOGO – 2ª
CENA
Surge a Humanidade - Vestuário: túnica cinza –
Fisionomia: assustada e atormentada – Gestos: de temor, horror, desolação,
enquanto caminha hesitante e aturdida no palco, silenciosamente – Música:
“Introduzzione alla morte de Margherita – Mefistofele”, de Arrigo Boito – Voz:
grave, compassada, de condenação – Local do palco: centro, movimentando-se em
vários sentidos.
Invectiva:
A HUMANIDADE
Guerra! Maldição que de tempos em tempos desce sobre os
homens e os abate.
Guerra! Maldição criada por alguns, no embate das
competições econômicas, no choque das ambições desenfreadas, no desmedido
egoísmo.
Guerra! Subversão dos sentimentos insuflada nos
corações das criaturas pela demagogia dos tiranos que fazem de cada homem um
fratricida.
Guerra! Crime! Degradação! Pavoroso e obscuro declive,
onde a Civilização caminha às cegas, calcando aos pés os milênios, em demanda à
animalidade primitiva.
Guerra! Destruição! Luto! Miséria! Maldição!
Quando deixarás de ensanguentar a carne dos meus
filhos?
RUÍDOS DE COMBATE
CERRA-SE O VELÁRIO
ATO I
Surge o Expedicionário - Vestuário: uniforme de
campanha da F.E.B., inclusive uma metralhadora de mão, que apoia no colo –
Fisionomia: séria, levemente acabrunhada – Voz: natural, compassada, como quem
está pensando alto – Gestos: somente os passos. As mãos fixam a metralhadora,
que exibirá discretamente, quando a ela se referir. Passos de sentinela em
serviço de ronda, em toda a extensão do palco.
Monólogo:
O EXPEDICIONÁRIO
Guerra! Eis-me envolvido em suas malhas.
Eu, a alma moça e pacífica do Brasil, acalentadora de
nobres e elevados ideais, transformada em instrumento de morte e destruição.
Por um fuzil troquei meus livros, meus arados, minhas
ferramentas de trabalho ordeiro e criador.
FISIONOMIA AGORA ANIMADA E OTIMISTA
Entretanto, uma força estranha anima-me o espírito.
Vingando o sangue dos meus irmãos sacrificados nos
mares, nesta guerra, sinto no entanto que ela é diferente e antevejo claramente
o seu alcance projetado no futuro.
Algo me diz e mostra que este colossal esforço das
Nações Unidas, de que sou uma parte ativa, é feito para impedir novas guerras e
estabelecer a liberdade e a cooperação entre os homens, a fim de possamos todos
legar uma vida pacífica aos que nos sucederem. Se eu sucumbir, meu esforço não
terá sido em vão.
FISIONOMIA AGORA DISPLICENTE E JOCOSA
Mas, deixemos de reflexões e prestemos atenção porque o
inimigo também ronda e A COBRA ESTÁ FUMANDO.
RUÍDOS DE COMBATE.
UM AVIÃO PASSA METRALHANDO. O EXPEDICIONÁRIO USA A SUA ARMA,
AJOELHANDO-SE NO SOLO, REVIDANDO O ATAQUE, ATÉ QUE TOMBA FERIDO.
CESSA O COMBATE.
ENTRA A ENFERMEIRA.
ATO II
Surge a Enfermeira - Vestuário: uniforme de campanha da
F.E.B., munida de cantil e bornal – Fisionomia: atenta, porém branda e meiga –
Gestos: solícitos de socorro, amparo e aconchego. Molha um lenço na água do
cantil e com ele limpa e refresca o rosto do Expedicionário caído no chão.
Dá-lhe a seguir água a beber, aproximando o cantil dos seus lábios e fala com
voz animadora e carinhosa.
Diálogo:
A ENFERMEIRA
Aqui estou para te acudir, soldado do Brasil!
O EXPEDICIONÁRIO
(caído no chão)
Quem és? Meus olhos não conseguem distinguir tuas
feições. Estou ferido. Creio que não resistirei aos ferimentos. Quem és?
A ENFERMEIRA
Sou a enfermeira brasileira, que juntamente contigo
atravessou o Atlântico revolto, para te socorrer quando caísses ferido em
combate, como agora.
Meu nome? Helena Ramos.
Venho para trazer-te o socorro de que precisas nesta
terra estranha. E com ele, tudo o que deixaste em teu rincão amado.
Os desvelos maternos, a ansiedade da noiva, o carinho
da irmã, que ficaram do outro lado do mar, tua família enfim, tu encontrarás
nos meus gestos e palavras.
Vim para que nada te faltasse e nada te faltará,
Soldado do Brasil!
Fé e coragem, Expedicionário! Por meu intermédio a
Pátria te assiste.
O EXPEDICIONÁRIO
Sinto que morrerei, mas estou tranquilo porque tombo
cumprindo o meu dever na defesa de um ideal superior. Tenho frio, muito frio.
Cada vez mais se anuviam os meus olhos e tua voz está
chegando fracamente aos meus ouvidos.
AGORA AGITADO E SURPRESO, ESFORÇANDO-SE POR LEVANTAR, NO QUE É AJUDADO
PELA ENFERMEIRA QUE APOIA O SEU BUSTO
Olha! Mais alguém se aproxima. Será outra enfermeira?
Mas não vem de uniforme. Há muita luz em suas vestes. Ela resplandece! Será
minha mãe que deixei lá no Brasil? Minha mãe… Minha mãe! Minha mãezinha
querida.
Olha! Ela se aproxima!
(voz fraca)
Quem será, Helena? Quem será, Hele…
A ENFERMEIRA
Sim, eu também a vejo.
É a imagem da Pátria que vem a ti nesta hora extrema.
Como é bela e radiante! Ela vem falar-te, Expedicionário.
Escutemos atentos a sua voz sagrada.
ATO III
Surge a Pátria – Vestuário: vestido branco ornamental –
Fisionomia: serena – Porte: majestoso – Voz: calma, afetuosa, tranquilizadora –
Gestos: sóbrios. Suas mãos descansarão frequentes vezes nos ombros dos menores
que a acompanharão – Acompanhamento: nas suas mãos a Bandeira Nacional e junto
a si e na sua frente a Nova Geração (um casal de alunos dos menores);
posteriormente as Nações com a respectiva bandeira, quando forem pronunciados
os seus nomes – Local: nas proximidades do Expedicionário que se acha caído,
com o busto apoiado no colo da Enfermeira.
Alocução:
A PÁTRIA
Expedicionário! Filho amado! Apesar da distância imensa
que nos separava, eu senti os teus ferimentos, como em minha própria carne,
logo que tombaste eu me afligi com tuas aflições, porque meu corpo e minha alma
são feitos do corpo e da alma de todos os Expedicionários, de todos os
Brasileiros.
E vim a ti, nesta hora extrema, para serenar a tua alma
aflita com a segurança da minha palavra. Ouve pois.
Não foi em vão que derramaste o teu sangue generoso em
terra estranha.
Grande é o alcance do teu gesto e profundos serão os
efeitos dele decorrentes.
O sacrifício feito agora por ti, testemunhado e
partilhado corajosamente por tua irmã, a Enfermeira Expedicionária, não se
perderá como a semente lançada à terra sáfara.
Ele resultará em benefícios para os teus irmãos mais
jovens, impedindo que eles, hoje crianças, tenham que, daqui a vinte anos,
trocar seus livros, seus arados, suas ferramentas de trabalho ordeiro e
criador, pelo fuzil assassino.
Em teu sangue, doravante, não se nutrirá o abutre do
armamentismo.
A mística liberticida e racista, que levou o mundo a
essa hecatombe, não mais encontrará guarida nos corações enlutados e tristes,
porque a experiência mostrou a todos o horror da sua aplicação, como norma de
conduta entre os povos.
Eu, unida às minhas irmãs e como elas vigilante aos
desregramentos dos filhos transviados, não permitirei a reprodução dessa
loucura.
ENTRARÃO AGORA AS NAÇÕES, QUANDOFOREM PRONUNCIADOS OS SEUS NOMES
Ei-las todas que vêm comigo confirmar as minhas
palavras e robustecer a minha voz. Elas também falaram assim em LONDRES,
VARSÓVIA, PARIS, BELGRADO, BURMA, PEARL HARBOR, STALINGRADO.
Venho para dizer-te que, buscando um futuro melhor e
mais digno para todos os meus filhos, empenhei com elas a minha palavra em
Teerã, na Crimeia e em Chapultepec, onde assinei as atas memoráveis com a tinta
rubra do teu sangue.
Tranquiliza pois tua alma e no regaço fraterno da
Enfermeira brasileira descansa teu corpo ferido, oh Expedicionário do Brasil!
O EXPEDICIONÁRIO ATÉ ENTÃO ATENTO, COMEÇA A DESFALECER NO COLO DA
ENFERMEIRA ATÉ SUCUMBIR TOTALMENTE, DE FORMA QUE SUA MORTE COINCIDA COM AS
ÚLTIMAS PALAVRAS DO PERÍODO SEGUINTE
Que os primeiros albores da nova era de paz e união
entre os homens possam iluminar a tua face de herói, em cujo sangue derramado
agora se erguerá uma nova civilização, justa, digna, gloriosa, que tu, filho
amado, legarás aos teus irmãos mais jovens como o melhor e mais valoroso dos
troféus!
CERRA-SE O VELÁRIO, POR TEMPO SUFICIENTE PARA QUE O EXPEDICIONÁRIO SE
RETIRE DE CENA. COM O VELÁRIO CERRADO, UM ALUNO, COMO LOCUTOR DE RÁDIO,
EXCLAMARÁ DA CAIXA PARA A PLATEIA:
Alô. Alô. Atenção brasileiros. Vitória da F.E.B. em
Monte Castello!
Atenção. As tropas soviéticas entram em Berlim!
Alô. Alô. Atenção. Rendição incondicional da Alemanha!
Terminou a guerra.
Vitória das Nações Unidas!
ABRE-SE O VELÁRIO, MOSTRANDO AS NAÇÕES UNIDAS E A ENFERMEIRA, DIANTE DAS
QUAIS DESFILAM OS ALUNOS COM O UNIFORME OLÍMPICO DA ESCOLA
FIM
EDMUNDO LINS
Fonte: STF
Nosso texto citou Edmundo Lins várias vezes. Veja a
biografia do mesmo no CPDOC:
LINS, EDMUNDO
*magistrado; min. STF 1917-1937.
Edmundo Pereira Lins nasceu em Serro (MG) no dia 13 de
dezembro de 1863, filho do escrivão Miguel da Silva Pereira Lins e de Antônia
Ferreira Campos Lins.
Órfão de pai aos quatro anos e de mãe aos 14, enfrentou
desde cedo grandes dificuldades econômicas. Ainda criança aprendeu os ofícios
de ourives e de ferreiro, trabalhando depois como caixeiro de armazém. Para
seguir seus estudos, iniciados na escola pública da cidade natal, precisou
contar com a proteção de seus professores. Em 1878 ingressou no Seminário de
Diamantina (MG), onde obteve admissão gratuita. Terminou os preparatórios e,
devido a seu bom aproveitamento, foi convidado em 1881 a lecionar no curso
preparatório do seminário, ao mesmo tempo em que iniciava o estudo de teologia
no seminário maior.
Chegou a receber a primeira tonsura e as ordens
menores, mas concluiu não ter vocação para o sacerdócio e deixou o seminário em
1883, transferindo-se para Ouro Preto, na época capital da província de Minas
Gerais.
Em 1885 matriculou-se na Academia de Direito (futura
Faculdade de Direito) de São Paulo, lecionando ao mesmo tempo latim e
matemática para sustentar-se. Em 1886, filiou-se ao Partido Republicano
Paulista e passou a colaborar em jornais acadêmicos com artigos de cunho
político. Formou-se no dia 18 de novembro de 1889, sendo nomeado no mês
seguinte promotor público em Jundiaí (SP). Permaneceu nesse posto até março do
ano seguinte, quando aceitou o convite de João Pinheiro, na época presidente de
Minas Gerais, para assumir o cargo de secretário da Repartição de Estatística
criada pouco antes em Ouro Preto. Ao mesmo tempo, ocupou o cargo de
redator-chefe de O Movimento, jornal de propaganda republicana fundado por João
Pinheiro em 1888.
Casou-se em 1890 com Brasilina Pinheiro e Prado, que
viria a falecer seis anos depois. Em novembro desse mesmo ano, com a
organização da Justiça Federal pelo governo provisório da República, foi
nomeado juiz substituto da seção de Minas Gerais, deixando a redação de O
Movimento.
Em 1892 foi nomeado juiz de direito de Tiradentes (MG),
de onde enviou ao governo do estado inúmeros relatórios, nos quais apontava
falhas da legislação vigente e sugeria emendas. Ao mesmo tempo, lecionava
gratuitamente para os rapazes pobres da cidade fornecendo-lhes material
escolar. Permaneceu em Tiradentes até 1897, quando tornou a transferir-se para
Ouro Preto, assumindo a diretoria da Secretaria do Interior. Nesse mesmo ano,
casou-se com Maria Leonor Monteiro de Barros. Ainda em 1897, concorreu em Ouro
Preto à cadeira de lente substituto da Faculdade de Direito de Minas Gerais,
sendo aprovado por unanimidade e passando a lecionar sucessivamente economia
política, direito romano e direito civil, até chegar à cátedra de direito
romano.
Após a inauguração da nova capital do estado, Belo
Horizonte, em 12 de dezembro de 1897, foi nomeado juiz em março de 1898 e
encarregado de instalar a nova comarca. Nela permaneceu até 1903, quando foi
nomeado desembargador do Tribunal de Relação de Minas Gerais, a cuja presidência
viria a ser conduzido dez anos depois.
Em 1915 foi convidado pelo governo de Minas Gerais para
arbitrar a questão Minas Gerais-Werneck, relativa às águas de Lambari.
Concluindo que o estado não tinha razão, Edmundo Lins proferiu contra ele sua
sentença. Devido a essa decisão, seu nome foi deixado de lado, embora sempre
indicado, no preenchimento de três vagas sucessivas no Supremo Tribunal Federal
durante o governo do mineiro Venceslau Brás (1914-1918). Em 1916, foi eleito
diretor da Faculdade de Direito de Minas Gerais, onde era catedrático. Durante
os anos em que lecionou na faculdade, publicou diversos trabalhos na Revista da
Faculdade Livre de Direito de Minas Gerais e na Revista Forense.
Ao se abrir uma quarta vaga no STF, em 1917, diversas entidades
representativas de advogados de Minas Gerais mobilizaram-se em favor de sua
nomeação e, afinal, em agosto de 1917, Edmundo Lins foi nomeado ministro do
STF, tomando posse no mês seguinte. Em dezembro de 1922, votou a favor da
concessão de habeas-corpus aos implicados nos acontecimentos de 5 de julho, por
considerar injustificado o excesso do prazo legal para a formação da culpa dos
acusados, tendo sido voto vencedor. Em janeiro de 1925, foi um dos que votaram
a favor do acórdão que beneficiava os revolucionários de 1922, considerando não
ter havido crime naqueles movimentos, que constituíram uma atitude de legítima
defesa contra os atos do governo Epitácio Pessoa em relação ao Exército. Em
novembro de 1930 manifestou-se contrário à concessão do habeas-corpus pedido em
favor do ex-presidente Washington Luís, que se encontrava detido por ordem da
junta militar governativa. O pedido foi negado pelo tribunal.
Eleito presidente do STF em 1931, Edmundo Lins foi
reeleito em 1934 e em 1937, até ser aposentado, logo após a decretação do
Estado Novo, em 16 de novembro de 1937. Entre as inúmeras sessões que presidiu,
destaca-se a de 20 de julho de 1936, em que foi julgado o pedido de
habeas-corpus impetrado pelo deputado João Mangabeira em favor de si próprio e
de outros implicados nos acontecimentos de novembro de 1935. Por maioria de
votos, o STF tomou conhecimento do pedido, mas negou o habeas-corpus por
unanimidade.
Em 1935, Edmundo Lins publicou Estudos jurídicos,
trabalho que lhe valeu a medalha Teixeira de Freitas do Instituto da Ordem dos
Advogados do Brasil. Além dessa obra, escreveu Miscelânea, publicada por seus
filhos em 1938, e Reminiscências literárias, publicada em 1941, reunindo
artigos que escrevera para o Jornal do Comércio.
Edmundo Lins faleceu no Rio de Janeiro no dia 10 de
agosto de 1944.
Dos dois casamentos que contraiu, teve 12 filhos, dos
quais dez sobreviveram. Entre eles, destacou-se Ivan Monteiro de Barros Lins
(1904-1975), médico, professor, escritor, ministro do Tribunal de Contas do antigo
estado da Guanabara e figura importante do positivismo no Brasil. Ivan Lins
publicou, sobre sua vida, Edmundo Lins: alguns traços de sua personalidade e
juízos de seus contemporâneos (1965). Sílvia Pantoja
FONTES: BALEEIRO, A. Supremo; CONSULT. MAGALHÃES, B.; Correio da Manhã
(22/12/1963); COSTA, E. Efemérides; COSTA, E. Grandes; Grande encic. Delta;
HORTA, C. Famílias; LAGO, L. Supremo; LEITE, A. História; SILVA, H. 1922; SUP.
TRIB. FED. Supremo.
ARTIGOS DE JORNAL SOBRE WLADIMIR MATTA
O Minas Gerais, 17 de
dezembro de 1899
O Minas Gerais, 13 de
julho de 1893
O Minas Gerais, 15 de
junho de 1897
O Monitor Mineiro,
Guaranésia, 16 de outubro de 1902
O Monitor Mineiro,
Guaranésia, 11 de Setembro de 1902
Domingas, 16 de outubro de
1932
Correio da Manhã, 19 de
fevereiro de 1956
Também em 1956 encontramos:
N. 318.478-56 - Ginásio Wladimir Matta - Autorizo o
pagamento, mediante registro prévio da despesa, que deverá correr à conta do
"Filado para Melhoria de beneficias.
Início da compilação e transcrições dia 26 de
setembro de 2017
Artigo escrito entre os dias 26 de setembro e 3
de outubro de 2017.
Inserido no livro em 9 de outubro de 2017